
TERÊZA TENÓRIO, VÍTIMA DE GRAVE DOENÇA, NÃO CONSEGUE MAIS ESCREVER, SOMOS AMIGOS, MAS ELA INFELIZMENTE NÃO ME RECONHECE MAIS. ACHA-SE ENVOLTA NO MAIS TRISTE ESQUECIMENTO ATÉ (NEM TODOS) DOS SEUS COMPANHEIROS DE GERAÇÃO. EU A VI CRESCER NA SUA POETISA, ORIENTADA INICIALMENTE PELO POETA E CRITICO LITERÁRIO CÉSAR LEAL. (Marcus Prado)
Teve seus primeiros poemas publicados pelo poeta César Leal no Suplemento Literário do Diário de Pernambuco. Normalmente considerada a musa da Geraçã0 65, publicou oito livros de poesia, entre os quais POEMACESO, prêmios de 1985 da Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA), da União Brasileira de Escritores do Rio de Janeiro. Detentora do prêmio de Poesia Dramatizada da Fundação de Cultura Cidade do Recife em 1992, foi considerada Autora do Ano de 1999 pela Editora Universum de Trento-Itália. Colaboradora de jornais e revistas oficiais e alternativos, nacionais e estrangeiros, participa de antologias poéticas na França, Itália, Espanha e Portugal. Veja a fortuna crítica aqui (Wikipédia).
Terêsa Tenório é uma das poetas de Pernambuco que se tem convertido em coluna da geração de 1965. Através da sua palavra poética, transitamos por imagens, símbolos e horizontes imaginários, repletos de beleza. Em “Corpo da Terra”, de cujo prólogo é autor Fábio Lucas, Teresa Tenório realiza a sua liturgia poética, regulada por uma atmosfera em que convivem o amor e a intimidade do vivido e o observado. A poesia de Teresa Tenório sulca o caminho de iniciação na reflexão e o diálogo. É uma criadora que nos surpreende com a sua habilidade expressiva e com a força do equilíbrio que emana dos seus poemas amorosos e cósmicos. (Xosé Lois García)
À Geração 65 , divulgada por César Leal e batizada por Tadeu Rocha, pertence Terêza Tenório. Sua poesia desde o início se caracteriza por uma facilidade de trânsito pelo contemporâneo derivado das vanguardas, uma lírica com traços simbolistas e experimentais, que sempre representou muito bem a produção pernambucana. Editada pela Civilização Brasileira e pela Filobiblion, entre outras casas editoriais do sul do país, observa-se ao longo da trajetória de Terêza o profissionalismo que destaca aqueles que consideram o poema como missão, como tarefa a realizar na terra, como método estético de união entre os homens. (Flávio Chaves)
Quando conheci a poesia de Terêza Tenório apaixonei-me quase que imediatamente. A força de sua lírica arrebatou-me de tal modo que a necessidade de entendê-la levou-me a estudar a sua obra. Poder participar junto com Lucila Nogueira da organização destes poemas inéditos de Terêza me traz uma satisfação indescritível.
Depois de algum tempo pesquisando a sua obra, tive acesso a seu arquivo, generosamente cedido pela autora, e comecei a verificar que vários escritos seus ainda estavam por publicar, seja por falta de interesse de Terêza por trazer à tona estes textos, seja porque não houve uma oportunidade de encaixá-los em obras anteriores, sempre muito bem estruturadas e definidas após inúmeras versões nas quais a autora eventualmente inclui, retira ou muda a ordem dos poemas, o que nos faz lembrar o rigor cabralino ao compor seus livros. A qualidade dos textos me fez pensar quão injusto seria mantê-los calados, longe dos olhos dos leitores ávidos da poetisa. (Wellington de Melo)
O livro A Musa Roubada, organizado por Lucila Nogueira e Wellington de Melo, é um perfeito tratado sobre a criação poética ao longo da carreira de uma das mais conhecidas e aclamadas – nacional e internacionalmente – poetas da Geração 65 de Recife: Tereza Tenório. (…)
Como nos revelou o poeta Alberto da Cunha Melo em apresentação ao livro POEMACESO, em relação à obra da autora, é difícil encontrar um só verso que não esteja comprometido com o motivo central do amor, e raro o poema em que a palavra amor não compareça com toda a sua carga e o seu sortilégio emotivos, com toda a força de um delírio obsessivo. Essa busca pelo lirismo refinado e elegante, mas não menos ardente, encontra-se também no A Musa Roubada, poema que dá nome à antologia: O teu amor é meu porto/ Minha paixão o que me guia/ Em teu vôo cardeal/ além de todos os rostos/ Além de todos os fogos/ Além de todos os ritos (p. 26).
Entre as performances da linguagem e os delírios estéticos do amor, Terêza não esquece os desprestigiados de nossa sociedade e lança uma crítica ao sistema patriarcal-capitalista com os seguintes versos:Os homens são atores/ cujo discurso/ decorre/ de um sistema autofágico (autofálico)/ de poder/ e eu aqui relembrando minha lavadeira/ dona Maria/ que ainda em jejum/ me trazia a roupa passada/ fazendo-me admirar a brancura/ dos meus lençóis perfumados (ATORES, p. 62) (André Cervinskis)
POEMAS DE TÊREZA TENÓRIO
(PUBLICAÇÃO DE ANTONIO MIRANDA E COORDERNAÇÃO DE LOURDES SARMENTO)
CORPO DA TERRA
Pela janela o verde
nos revela
o coração da mata acesa
o úmido
veio das aromáticas
resinas
dentre nossas raízes
enlaçadas
a destilar a essência
do teu hálito
em mim
corpo da terra
desvelado
NÃO OS QUERÍAMOS SAGRADOS
A Aluizio Barro de Carvalho
e Telma Nóbrega Tenório de Albuquerque
Não os queríamos sagrados nos ritos da sombra
Peregrinos do silêncio
como saber se lembrarão o vôo dos pássaros
a textura da rosa
os insondáveis caminhos?
A obsidiana revolve a terra
em busca do coração da argila
e seus dolorosos anéis
mais o selo de sangue puríssimo
Não os queríamos no Além
os anjos pairando sobre as luminosas cabeças
as mãos em cruz
sentados à direita
do oráculo
mortos
Corpo da Terra, 1994
VIRTUAL
No epicentro das ondas invisíveis
edifiquei mandalas para os celtas
habitantes dos últimos milênios
guelras de peixes e barbatanas retas
Onde o mar arrastara nossas redes
para morder-nos tênues fios de espera
o fluir das espumas retalhou
os tecidos da carne contra as pedras
nos módulos lunares dissolvi
toda a sombra da superfície líquida
seus cardumes de tubarões-martelo
entre indormidos teoremas míticos
arremessei ao lume destes versos
nossa imagem virtual de estranhos ritos
TRÍPODES
Queimados os corações
no sacrifício dos remos
sobre a pedra dos oráculos
reedificamos o templo
Marujos noutro avatar
fomos mortos ao relento
entre carvalhos e trípodes
no temor ao deus sangrento
No corolário da lenda
filha dos quatro elementos
fertilizamos a terra
na fenda ao sul do oriente
ao fim do embate mortal
a seiva do sol no zênite
Fábula do Abismo, 1999
TENÓRIO, Terêza. A casa que dorme. Recife: LivroRápido, 2002. 73 p. 14,5×20,5 cm. Capa: Franci Pena. Col. A.M.
CASO
O meu primeiro amor morreu de fome
O meu segundo amor não teve jeito
O meu terceiro amor se fez amante
recebendo-me à tarde radiante
Até hoje vivemos do seu jeito
como meu último amor
fatal
perfeito
O EXÍLIO DO POUSO DAS ESTRELAS
Trinta e três luas acesas
no tempo do desencontro
Trinta e três vozes amargas
no rastro das diligências
Trinta e três pedras de toque
vazias de toda crença
Trinta e três sorrisos mortos
nos lábios do afogado
Trinta e três sais na moleira
da que ficou sem o amigo
da que ficou sem parelha
da que ficou sem marido
a misturar na poeira
a dor desse amor perdido
MARIA SUSSUARANA
Não tenho medo da morte
Nem tenho medo da noite
Só tenho medo da força
que me prende em seu açoite
Não me virás por amor
mas paixão de vida ou morte
que a força do meu quebranto
nos amarra à mesma sorte
Sou cobra sussuarana
Meu cheiro é sangue no corte
melaço e caldo de cana
Salvou-te do meu quebranto
adormecido senhor
teu encanto e rezas fortes
TEXTOS EN ESPAÑOL
Extraídos de
ANTOLOGÍA DE LA POESÍA BRASILEÑA
Org. y traducción de Xosé Lois García
Santiago de Compostela: Edición Loiovento, 2001.
CUERPO DE TIERRA
Por la ventana el verde
nos revela
el corazón del bosque encendido
la humedad
vino de las aromáticas
resinas
de entre nuestras raíces
enlazadas
destilando la esencia
de tu aliento
em mí
cuerpo de la tierra
desvelado
NO LOS QUERÍAMOS SAGRADOS
A Aluizio Barro de Carvalho
e Telma Nóbrega Tenório de Albuquerque
No los queríamos sagrados en los ritos de la sombra
Peregrinos del silencio
¿Cómo saber si recordarán el vuelo de los pájaros
la textura de la rosa
los insondables caminos?
La obsidiana rebusca la tierra
buscando el corazón de arcilla
y sus dolorosos anillos
más com sello de sangre purísima
No los queríamos en el más Allá
los ángeles planeando sobre las luminosas cabezas
las manos en cruz
sentados a la derecha
del oráculo
muertos
Corpo da Terra, 1994
VIRTUAL
En el epicentro de las olas invisibles
edifique mandalas para los celtas
los habitantes de los últimos milênios
bronquios de pecesy barbatanas rectas
Donde el mar arrastra nuestras redes
para picar en los tenues hilos de espera
los tejidos de la carne contra las piedras
En los módulos lunares disolví
toda la sombra de la superfície líquida
sus bancos de tiburones martillo
entre indormido teoremas míticos
lance al fuego de estos versos
nuestra imagen virtual de extraños ritos
TRÍPODES
Quemados los corazones
en el sacrificio de los remos
sobre la piedra de los oráculos
reedificamos el templo
Marineros en otro avatar
fuimos muertos al ralente
entre robles y trípodes
em temor al dios sangriento
En el corolario de la leyenda
hija de los cuatro elementos
fertilizamos la tierra
en la grieta al sur de oriente
al final del choque mortal
la savia del sol em el cénit
Fábula do Abismo, 1999