por Moacir Japiassu
“Aqui dorme Bocage, o putanheiro;
Passou vida folgada e milagrosa;
Comeu, bebeu, fodeu sem ter dinheiro”.
(Epitáfio que o poeta legou a todos nós)
Entre ‘supostos’ e ‘suspeitos’, o sofrível noticiário está pior a cada dia
O considerado Luiz Fernando Perez, um dos melhores jornalistas do Brasil, velho amigo e companheiro no Correio de Minas de 1962, despacha de seu escritório na Praça da Savassi, em Belo Horizonte:
Não sei se é falta de jornalismo (afinal, ‘suposto’ significa dois anos de desinformação) ou excesso de zelo (de novo, o suposto) para evitar processos judiciais. Qualquer que seja o caso, porém, não dá para suportar títulos como o estampado no portal de O Globo, completado pelo condicional do ‘bigode’, nesta sexta-feira, 17 de janeiro:
* Hollande e Julie Gayet mantêm suposto affair há dois anos
* Romance secreto entre presidente da França e atriz teria começado durante a corrida presidencial de 2012
(De qualquer forma, trata-se de um atestado de incompetência jornalística.)
Janistraquis concorda e confessa que está de saco cheio com tais, digamos, improficiências:
“Muitas vezes o bandido é preso com a arma na mão, confessa o crime e os repórteres e apresentadores a ele se referem como ‘suspeito’. Ora, suspeito é primo-irmão de suposto e ambos devem ir para a…”
[O escritor Moacir Japiassu – meu romancista preferido, que historiou as duas principais “revoluções” republicanas: 1930, “Concerto para Paixão e Desatino”; e 1964, “Quando Alegre Partiste, Melodrama de um Delirante Golpe Militar”- mandou, via imeio, reproduções de capas dos jornais franceses
para a comparação com o “suposto” e “suspeito” jornalismo
viugente
vilgente
virgente
praticado no Brasil hoje.]
Do Jornal da ImprenÇa, escrito por Moacir Japiassu, transcrevo
PRONUNCIA CERTA
O mesmo Luiz Fernando dá a receita, ou melhor, aponta o caminho das pedras aos repórteres e editores que não têm muita intimidade com o idioma:
Nestes tempos de farras adolescentes nos shoppings (às vezes contaminadas por militantes de partidos políticos, entidades sindicais e marginais), seria muito saudável que repórteres e editores consultassem o VOLP, para aprender a pronunciar e a escrever as palavras rolé e rolezinho.
Faladas, ambas têm o som aberto e não como muitos vêm dizendo: ‘rolêzinho”. Na escrita, dispensam as aspas, pois rolé, que significa passeio, volta, consta do VOLP, na página 727, à frente de rolê (movimento de capoeira ou enrolado).
Em tempo: VOLP significa Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, cartapácio editado pela Academia Brasileira de Letras, com os vocábulos da língua culta. Está na quinta edição (de 2009) e incorpora as mudanças do Acordo Ortográfico de 12 de outubro de 1990, ainda não oficialmente em vigor, devido a novo adiamento.
As duas grafias também constam de ‘antigos’ dicionários, como a segunda edição do Aurélio, de 1986.
VELHICE
Espalharam pelo mundo afora que um “estudo alemão” garante: excesso de conhecimento causa falha de memória na velhice. A revelação deixou Janistraquis preocupadíssimo; é que aos 72 anos, íntimo da obra de filósofos e escritores vitais, ele acaba de anunciar matrícula num curso de alemão para ler Kant no original. Todavia, não consegue se lembrar quando começa — nem aonde.
DAR EM PÚBLICO
A considerada Ester Ionetta Restier, professora paulistana aposentada, envia trecho de entrevista da Folha com a artista Marina Abramovic, de 67anos, vista pelos fãs como “o maior nome da performance de todos os tempos, um mito vivo.”
Marina — “(…) Performance é uma forma muito direta de arte, não é como uma pintura na parede. É uma arte baseada no tempo, está acontecendo daquele jeito, naquela hora e, se você não prestar atenção, perdeu.”
Folha — “Mas esse é um gênero que caiu em decadência e hoje tenta se recuperar. Como vê ações polêmicas, como a do estudante britânico que anunciou que vai perder a virgindade anal diante da plateia em Londres?”
Marina — “Existe arte boa e arte ruim. Não importa se ele vai mesmo perder a virgindade ali. O que importa é a energia que ele cria com esse trabalho, se isso for capaz de atingir alguma ressonância para aqueles que estão ao redor.”
Dona Ester, que se diz “mais vivida do que Marina Abramovic”, ficou perplexa com a resposta do “mito vivo”:
“Um jovem que anuncia a perda da virgindade anal em público deveria enojar qualquer pessoa; isso de ‘atingir ressonância para aqueles que estão ao redor’ é coisa de quem não sabe do que está falando!”
Janistraquis, que não se escandaliza com mais nada neste mundo, tem certeza de que o tal jovem está mentindo ao se referir à virgindade anal:
“O que essa bichona já fez por aí entre quatro paredes não deve estar no gibi…”