Talis, 78, jornalista desempregado

Este título peguei emprestado do amigo e jornalista maior do País da Geral, José de Souza Castro que, para honra minha escreveu o prefácio do meu livro de poesia

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Revelou Castro: “Vim a conhecer Talis Andrade há uns quatro anos, por causa dos comentários dele na coluna de Moacir Japiassu, no Comunique-se, e de seus sábios escritos em três blogs do próprio poeta: Arte e Versos, Aqui não dá e Jornalismo de cordel. Não sei como, aos 70 anos, ele acha tempo para manter atualizados esses blogs e escrever poesia, ganhando um salário mínimo de aposentadoria pelo INSS. É um mistério: como um poeta brasileiro, ainda por cima nordestino, sobrevive?”

Olha, gente, jamais seria salvo pela poesia, mesmo que “eu me chamasse Drummond”. Ascenso, no leito de morte, disse para mim e o governador Paulo Guerra, que ser poeta é um “mal de raiz”.

Danação de vida. Sempre tive de exercer, penosa e comitantemente, três malsinadas profissões. Professor, jornalista e barnabé.  Que o salário de uma não sustenta nenhum vivente.

Não tenho a grandeza de um Luiz Carlos Maciel, mas me ofereço, que não me faltam gosto nem fôlego, para exercer profissões da minha vocação e aprendizado.

Luiz Carlos Maciel, 77,

filósofo desempregado

por José de Souza Castro

Luiz Carlos Maciel
Luiz Carlos Maciel

Leio no blog do poeta pernambucano Flávio Chaves que o filósofo Luiz Carlos Maciel está desempregado há quase um ano. Tem 77 anos e está sem dinheiro. Ele se oferece para trabalhar, avisando que só não canta e dança. No mais, o que vier, “eu traço”.

É possível que algum leitor nunca tenha ouvido falar de Luiz Carlos Maciel. Foi um dos fundadores de O Pasquim, surgido seis meses depois do AI-5, quando a ditadura militar se impunha como nunca. E o jornal se revelou como flor do lodo, no brejo político e social em que se transformara o Brasil: em pouco tempo, vendia mais de 200 mil exemplares por edição.

Posso poupar tempo, encaminhando o leitor a este artigo escrito em julho de 2004 pela historiadora paulistana Patrícia Marcondes de Barros. Um resumo:

“Jornalista, dramaturgo, roteirista de cinema, filósofo, poeta e escritor. Apesar de sua vasta atuação no cenário cultural brasileiro, Luiz Carlos Maciel é comumente lembrado por sua participação no Pasquim, com a coluna Underground, quando então escrevia artigos sobre os movimentos alternativos que eclodiam no mundo, assim como as manifestações anteriores que lhes serviram de base, como o romantismo, o surrealismo, o existencialismo sartreano, a literatura da Beat Generation, o marxismo, entre muitos horizontes (re)descobertos na época. Este trabalho de difusão da contracultura lhe valeu o estereótipo de ‘guru da contracultura brasileira’ ”.

No final do artigo há uma breve cronologia dos trabalhos realizados por Luiz Carlos Maciel até 2004. Uma lista impressionante. Vivesse nos Estados Unidos ou na Europa, onde a cultura tem valor, esse gaúcho não teria chegado aos 77 anos desempregado e sem dinheiro.

Mas ele vive no Brasil. País onde cultura e velhice são desprezadas. Pior, se além de velho, é mulher, negra e faxineira.

No mesmo dia em que tomei conhecimento do caso de Luiz Carlos Maciel, soube do que aconteceu com a faxineira de um prédio residencial num bairro de classe média alta de Belo Horizonte. Um prédio de oito andares, com um apartamento de quatro quartos por andar.

Até agosto de 2012, o prédio tinha contrato de administração assinado com empresa especializada. O condomínio pagara a essa empresa, em 12 meses, um total superior a R$ 10 mil, incluindo salário da faxineira, INSS, FGTS e vale transporte. Havia faxina cinco dias por semana.

Para economizar, o condomínio decidiu cancelar o contrato e pagar diretamente a duas faxineiras que, conforme a lei, não têm qualquer direito trabalhista. Uma delas trabalha quatro horas por dia, dois dias por semana; outra, um dia por semana, durante oito horas. O gasto total caiu para R$ 9.520 no ano.

As faxineiras são as mesmas, até agora. Mas houve uma mudança: a que trabalhava um dia por semana, durante oito horas, passou a trabalhar por quatro horas, há cerca de três meses. O salário foi reduzido também pela metade. Mas a perda para ela é maior do que 50%, pois enquanto gastava com ônibus “x”, tirado de seu salário “y”, agora gasta o mesmo “x” tirado de metade do “y”. Um matemático pode calcular melhor do que eu a perda da faxineira.

Ela aceitou, sem reclamar da decisão da síndica. “O que eu podia fazer?”, perguntou-me ela. “Tenho 69 anos, e ninguém vai me empregar para fazer faxina, mesmo que eu possa trabalhar direitinho com essa idade. É melhor pingar do que secar”, filosofa.

“O que vier, eu traço”, diz o filósofo desempregado Luiz Carlos Maciel, oito anos mais velho.
A culpa é da crise econômica, que pesa mais para os mais fracos. Só dela? Não pesa nada na consciência dos mais ricos – não é, papa Francisco?

Escreve Moacir Japiassu

Moacir Japiassu2

 

Chance & risco
Chamada de capa do UOL:

Estocar água
eleva chance de
afogamento
infantil em casa

Janistraquis só não deu risada porque o assunto é sério:

“Para o redator do UOL, se você encher um balde grande e não providenciar cerca de proteção, terá boa chance, ou seja, terá ótimas possibilidades de ver um filho morto. Note bem: o comprador do balde não corre o risco de afogar a criança, só aumenta a chance da tragédia… Pois se eu fosse diretor do UOL, o responsável pela chamada seria escalado para cobrir baile gay na terça-feira de Carnaval!!!”

 

Céu e inferno

Por sugestão do considerado Elio Gaspari em sua coluna, Janistraquis visitou o endereço do YouTube abaixo reproduzido e adorou a “campanha eleitoral” de Maviael Melo, compositor, poeta, cantador e cordelista pernambucano.

 

Samba-enredo

Mais uma do nosso Roldão, em carta publicada na Folha de quinta-feira, 12/2:

Um fantástico patrimônio cultural brasileiro –a música de Carnaval– vem sendo desprezado. Explico: as músicas de Carnaval, com harmonia e melodia, acabaram. Há mais de 50 anos, só existe o samba-enredo, que é uma batucada, uma marcha acelerada para apressar o desfile.

 

(Transcrevi trechos. Leia mais)

DEPOIS DO SUCESSO DE LULA, QUE TAL UM ÍNDIO PARA SER PRESIDENTE DO BRASIL?

por Moacir Japiassu

índio

Se Luiz Inácio da Silva, apelidado Lula, fantasioso analfabeto nordestino, foi presidente do Brasil e fez sucesso no mundo inteiro exatamente por causa de tanta singularidade, imagine o leitor deste Jornal da ImprenÇa se nosso país vier a ser comandado por um índio! Até mesmo um índio que foge às características da raça, como eu, Moacir Japiassu, que (surpresa das surpresas!) tenho raízes na Nação Tabajara, a qual habitava o litoral paraibano.

Filho, neto, bisneto, tataraneto de caciques, meu nome significa Grande Pássaro (Japi-Açu) Filho da Dor(Mo-acy). Todavia, como não sou candidato a cargo algum, prefiro que outro índio substitua Lula nos corações dos povos, um índio como esse que foi personagem de grande reportagem da revista alemã Der Spiegel, cuja tradução abriga-se no UOL. Eis um trecho do relato deverasmente espetacular:

No final dos anos 60, um homem apareceu no Estado do Acre, no meio da região amazônica. Ele usava um pano amarrado sobre os genitais e uma pena, carregava um arco e dizia que era Tatunca Nara, chefe de Ugha Monulala. Ninguém nunca tinha ouvido falar de uma tribo indígena com aquele nome. Além disso, o homem não se parecia em nada com um índio. Ele era branco e falava com um forte sotaque francês.

Ele dizia que tinha herdado o sotaque de sua mãe, explicando que ela era uma freira alemã que havia sido levada pelos índios. Seu povo, segundo ele, vivia em uma cidade subterrânea chamada Akakor, e o alemão era a única língua falada lá – resultado da prole de 2.000 soldados nazistas que viajaram pela Amazônia em submarinos.

(Rogo ao considerado leitor que procure a íntegra da matéria de Der Spiegel no Google, sob o título Tatunca Nara: alemão vive na Amazônia e tem até RG que diz que ele é índio. A providência se justifica; é que não consegui inserir o link de jeito nenhum!!!)


Grande romancista Moacir Japiassu, e jornalista das principais redações do Brasil, encontrei outro link aqui

Fanatismo e faniquito na Imprensa

Sofia Mamalinga
Sofia Mamalinga

 

Vamos aos termos in Dicionário Aulete:

1. Faniquito. Pop. Crise nervosa, curta e sem gravidade; chilique; fricote
[F.: fanico “acidente histérico”+ -ito.]

2. Fanático. Que crê cegamente numa doutrina política ou religiosa, e se mostra intolerante com outras crenças ou opiniões. Que se julga inspirado por um ser divino

O Brasil possui 32 partidos políticos, que equivale a não ter nenhum, porque até os nomes são desconhecidos.

Qual a ideologia desses partidos? Não entendo o porquê do Superior Tribunal Eleitoral aceitar o registro de um partido sem um ideário.

Qual a diferença entre o Partido Comunista Brasileiro (PCB) e o Partido Comunista do Brasil (PCdoB)?

Temos oito partidos trabalhistas. Qual a diferença entre o Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido Trabalhista do Brasil (PTdoB)?

Existem três partidos socialistas: Partido Socialista Brasileiro (PSB), Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU) e Partido do Socialismo e Liberdade (PSOL).

E o que é socialismo? In Aulete:

1. Nome de diversas ideologias e doutrinas que defendem, de um modo geral, tanto a propriedade coletiva dos meios de produção (a terra e o capital), como a organização de uma sociedade sem classes
2. P.ext. Soc. Modo de produção e sistema social concebidos de acordo com essas doutrinas, em que prevaleçam a coletivização equitativa da riqueza e a eliminação das contradições sociais.
[F.: Do fr. socialisme. Cf.: capitalismo e comunismo.]

Socialismo científico
1 (Corrente ou doutrina que prega a) organização coletivista e igualitária da sociedade, concebendo-a a com base no estudo das leis históricas da transformação social e, esp., nas análises econômicas e políticas. [Us. não raro com referência aos marxistas, adeptos do materialismo histórico, e p.opos. a socialismo utópico.]

Socialismo utópico
1 (Doutrina que prega a) organização coletivista da sociedade, concebida segundo algum ideal de perfeição social, e que não é resultante da compreensão e transformação da sociedade vigente. [Us. não raro com conotação negativa, com conotação de inconsistência ou inviabilidade históricas, p.opos. ao socialismo científico.]

O Partido Socialista Brasileiro lançou seu presidente Eduardo Campos como candidato a presidente do Brasil. Acontece que todas as lideranças do PSB defendem a propriedade privada e uma sociedade dividida em classes.

Com o nome de Social temos seis partidos. O social de socialismo, no caso do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), que agrupa as maiores fortunas do Brasil, os tucanos. E tem como candidato a presidente Aécio Neves.

Fiel leitor reprova “sanha oposicionista” do Jornal da ImprenÇa
Escreve Moacir Japiassu: “O considerado Alfredo Spinola de Mello Neto, jornalista que nunca exerceu esta aflitiva profissão, trocando-a pela advocacia, é paulistano, tem concorrida banca na capital e informa, para nossa alegria e algum assombro:

‘Desde a revista Imprensa não perco uma só de suas colunas, embora atualmente por vezes a sanha oposicionista me aborreça. Criticar é perfeito, sempre; buscar picuinhas a ponto de demonstrar torcida em sentido contrário torna-se exasperante.’

Janistraquis adorou a ‘sanha oposicionista’, mas tanto ele quanto eu achamos que o fidelíssimo leitor exagera; afinal, não existe propriamente ‘sanha’, porém simples repugnância por esse desgoverno fascista e desonesto. Somos independentes aqui no Jornal da ImprenÇa, porque o Comunique-se não se vende ao PT e assim nos permite uma liberdade difícil de se encontrar por aí.

Todavia, não foi somente para criticar a tal ‘sanha oposicionista’ que nos escreveu o doutor Alfredo Spinola de Mello Neto, cujo nome é um verso alexandrino. Ele começou por transcrever a abertura da coluna da semana passada:

Tomo a liberdade de responder a pergunta do cronista/cineasta, ao recordar que no dia primeiro de abril de 1964 eu estava na sucursal d’O Diário de S. Paulo, modesta sobreloja da Rua do Carmo, 6, à espera do nosso chefe, Léo Guanabara, que nos traria notícias de uma das mais confiáveis fontes, o coronel Dagoberto Rodrigues, diretor dos Correios e Telégrafos, de quem Léo era o principal assessor.

Em seguida, o advogado engatou a prise:

‘Essa candura ao relatar acriticamente que o chefe era o principal assessor de um coronel ocupante de alto cargo público em 1º de abril de 1964 (não faria diferença se fosse em 31 de dezembro de 1999 ou em 7/7/2007) denotaria tolerância para com a promiscuidade entre o poder e a profissão liberal – especialmente quando se fala de um jornalista chefe de Redação em jornal privado?’

O senhor não me disse sua idade, doutor Spinola, mas acredite que se hoje a maioria dos jornalistas não recebe salário suficiente para encarar uma ação na Justiça, imagine há meio século! Muitos e muitos colegas amargavam dois, três empregos, e era comum ainda acrescentarem os proventos dalguma prebenda ou sinecura. E não deixavam de ser honestos. Promiscuidade entre o poder e a profissão liberal existe hoje, por causa da militância (remunerada) a serviço do PT.

Léo Guanabara, como está dito no texto da semana passada, era o principal assessor de uma das melhores ‘fontes’ do Brasil, o que já explica e justifica o cargo do jornalista de excelente formação profissional e moral. E, convenhamos, jornal privado nem sempre era jornal independente, mais ainda quando fazia parte dos Diários Associados. Janistraquis toma a liberdade de lhe sugerir a leitura do excelente livro Chatô, o rei do Brasil, do nosso velho e querido amigo Fernando Morais”. Leia mais 

Ouso dizer que a salvação do jornalismo está na sua volta às origens. No jornalismo opinativo. E Moacir Japiassu ama o debate. Nada mais democrático.

O fanático detesta o debate. Ama o pensamento único. É’pago pelo partido ou dado ao faniquito. Dado demais.

 

 

 

 

 

prisão mente apatia fanatismo fotógrafo

MISTÉRIO DAS ONGS

por Moacir Japiassu

 

Ongs-no-Brasil

 

Chegou à nossa redação, procedente de várias porém confiáveis fontes:

 

 

Por que não tem ONGs no Nordeste seco?

Você consegue entender isso?

Vítimas da seca:

Quantos? 10 milhões.

Sujeitos à fome? Sim.

Passam sede? Sim.

Subnutrição? Sim.

ONGs estrangeiras ajudando: Nenhuma!

Índios da Amazônia:

Quantos? 230 mil

Sujeitos à fome? Não

Passam sede? Não

Subnutrição? Não

ONGs estrangeiras ajudando: 350

Provável explicação:

A Amazônia tem ouro, nióbio, petróleo, as maiores jazidas de manganês e ferro do mundo, diamante, esmeraldas, rubis, cobre, zinco, prata, a maior biodiversidade do planeta (o que pode gerar grandes lucros aos laboratórios estrangeiros) e outras inúmeras riquezas que somam 14 trilhões de dólares.

O nordeste não tem tanta riqueza, por isso lá não há ONGs estrangeiras ajudando os verdadeiramente famintos.

Entenda:

Há mais ONGs estrangeiras indigenistas e ambientalistas na Amazônia brasileira do que em todo o continente africano, que sofre com a fome, a sede, as guerras civis, as epidemias de AIDS e Ebola, os massacres e as minas terrestres.

Agora, uma pergunta:

Você não acha isso, no mínimo, muito suspeito???

Entre ‘supostos’ e ‘suspeitos’, o noticiário está pior a cada dia

por Moacir Japiassu

“Aqui dorme Bocage, o putanheiro;

Passou vida folgada e milagrosa;

Comeu, bebeu, fodeu sem ter dinheiro”.

(Epitáfio que o poeta legou a todos nós)

Entre ‘supostos’ e ‘suspeitos’, o sofrível noticiário está pior a cada dia

O considerado Luiz Fernando Perez, um dos melhores jornalistas do Brasil, velho amigo e companheiro no Correio de Minas de 1962, despacha de seu escritório na Praça da Savassi, em Belo Horizonte:

 Não sei se é falta de jornalismo (afinal, ‘suposto’ significa dois anos de desinformação) ou excesso de zelo (de novo, o suposto) para evitar processos judiciais. Qualquer que seja o caso, porém, não dá para suportar títulos como o estampado no portal de O Globo, completado pelo condicional do ‘bigode’, nesta sexta-feira, 17 de janeiro:

* Hollande e Julie Gayet mantêm suposto affair há dois anos

* Romance secreto entre presidente da França e atriz teria começado durante a corrida presidencial de 2012

(De qualquer forma, trata-se de um atestado de incompetência jornalística.)

Janistraquis concorda e confessa que está de saco cheio com tais, digamos, improficiências:

“Muitas vezes o bandido é preso com a arma na mão, confessa o crime e os repórteres e apresentadores a ele se referem como ‘suspeito’. Ora, suspeito é primo-irmão de suposto e ambos devem ir para a…”

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[O escritor Moacir Japiassu – meu romancista preferido, que historiou as duas principais “revoluções” republicanas: 1930, “Concerto para Paixão e Desatino”; e 1964, “Quando Alegre Partiste, Melodrama de um Delirante Golpe Militar”- mandou, via imeio, reproduções de capas dos jornais franceses

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para a comparação com o “suposto” e “suspeito” jornalismo

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vilgente
virgente

praticado no Brasil hoje.]

Do Jornal da ImprenÇa, escrito por Moacir Japiassu, transcrevo

PRONUNCIA CERTA

Rolé ou rolê?
Rolé ou rolê?

O mesmo Luiz Fernando dá a receita, ou melhor, aponta o caminho das pedras aos repórteres e editores que não têm muita intimidade com o idioma:

Nestes tempos de farras adolescentes nos shoppings (às vezes contaminadas por militantes de partidos políticos, entidades sindicais e marginais), seria muito saudável que repórteres e editores consultassem o VOLP, para aprender a pronunciar e a escrever as palavras rolé e rolezinho.

Faladas, ambas têm o som aberto e não como muitos vêm dizendo: ‘rolêzinho”. Na escrita, dispensam as aspas, pois rolé, que significa passeio, volta, consta do VOLP, na página 727, à frente de rolê (movimento de capoeira ou enrolado).

Em tempo: VOLP significa Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, cartapácio editado pela Academia Brasileira de Letras, com os vocábulos da língua culta. Está na quinta edição (de 2009) e incorpora as mudanças do Acordo Ortográfico de 12 de outubro de 1990, ainda não oficialmente em vigor, devido a novo adiamento.

As duas grafias também constam de ‘antigos’ dicionários, como a segunda edição do Aurélio, de 1986.

VELHICE

velhice

Espalharam pelo mundo afora que um “estudo alemão” garante: excesso de conhecimento causa falha de memória na velhice. A revelação deixou Janistraquis preocupadíssimo; é que aos 72 anos, íntimo da obra de filósofos e escritores vitais, ele acaba de anunciar matrícula num curso de alemão para ler Kant no original. Todavia, não consegue se lembrar quando começa —  nem aonde.

DAR EM PÚBLICO

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A considerada Ester Ionetta Restier, professora paulistana aposentada, envia trecho de entrevista da Folha com a artista Marina Abramovic, de 67anos, vista pelos fãs como “o maior nome da performance de todos os tempos, um mito vivo.”

Marina — “(…) Performance é uma forma muito direta de arte, não é como uma pintura na parede. É uma arte baseada no tempo, está acontecendo daquele jeito, naquela hora e, se você não prestar atenção, perdeu.”

Folha — “Mas esse é um gênero que caiu em decadência e hoje tenta se recuperar. Como vê ações polêmicas, como a do estudante britânico que anunciou que vai perder a virgindade anal diante da plateia em Londres?”

Marina — “Existe arte boa e arte ruim. Não importa se ele vai mesmo perder a virgindade ali. O que importa é a energia que ele cria com esse trabalho, se isso for capaz de atingir alguma ressonância para aqueles que estão ao redor.”

Dona Ester, que se diz “mais vivida do que Marina Abramovic”, ficou perplexa com a resposta do “mito vivo”:

“Um jovem que anuncia a perda da virgindade anal em público deveria enojar qualquer pessoa; isso de ‘atingir ressonância para aqueles que estão ao redor’ é coisa de quem não sabe do que está falando!”

Janistraquis, que não se escandaliza com mais nada neste mundo, tem certeza de que o tal jovem está mentindo ao se referir à virgindade anal:

“O que essa bichona já fez por aí entre quatro paredes não deve estar no gibi…”

O baixo nível (ou má-fé?) das reportagens policiais da TV

por Moacir Japiassu

Professora em São Paulo, Analu de Freitas Barros escreve de sua casa em Pinheiros para reclamar do que vê e, principalmente, do que escuta sempre nos telejornais:

“É tão impressionante a ignorância (ou má-fé?)  dos repórteres que eles não encontram palavras para denominar os personagens de suas reportagens. Parece que é proibido dizer que ladrão é ladrão, assaltante é assaltante; não existem bandidos ou assassinos no paupérrimo vocabulário deles.

Para nós telespectadores, muitos e muitos dos quais vítimas de criminosos, ouvir repórter chamá-los de ‘rapazes’, é, no mínimo, falta de respeito. Ora, rapazes são nossos filhos e netos! Será que esse absurdo não passa pela cabeça dos chamados ‘profissionais da imprensa’?

E nem vou falar da falta de imagens nítidas dos marginais presos, porque os rostos não aparecem. Amanhã, bate na porta de sua casa o mesmo bandido que estava na reportagem da TV e você pensa que é um ‘rapaz’ do bem…”

Paciência...

Aliás, e a propósito, o considerado Eduardo Almeida Reis, maior cronista diário da imprensa brasileira, escreveu em sua coluna do Estado de Minas:

“(…) Jornalistas que vivem do sangue aparecem mais cedo, no final da tarde, ficando na telinha cerca de duas horas.

São muito repetitivos, não só nos comentários como também por exibir as mesmas matérias diversas vezes no mesmo programa, com reedições nos dias seguintes. Até aí, tudo bem: estão na tevê porque há público, portanto patrocinadores. As televisões e os seus apresentadores vivem disso.

Se me permitissem palpitar, pediria que tomassem cuidado na adjetivação e no adverbiar os fatos delituosos. Seus comentários nunca se esquecem de dizer que o crime foi lamentável, como se houvesse crime louvável, elogiável, recomendável. Todos são cruelmente assassinados, talvez para distinguir dos homicídios amavelmente praticados. O negócio vai por aí e dá ibope. Paciência.

Escândalo gaúcho

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O colunista encontrou meios de multiplicar as horas do dia para não adiar a leitura do livro do considerado Celito De Grandi, intitulado Caso Kliemann – A história de uma tragédia, raríssima reportagem policial escrita com o talento  literário que a transforma num verdadeiro romance.

Celito, um dos maiores jornalistas e escritores do Brasil, conta a história de um crime ocorrido em junho de 1962, em Porto Alegre, quando a mulher de um deputado estadual foi encontrada morta e o marido logo apontado como suspeito do crime.

Repórter na época, o autor do livro acompanhou o dia-a-dia do escândalo, e, décadas mais tarde, com a precisão da memória, as pesquisas sobre aquele tempo e a colaboração das três filhas do casal Kliemann, Celito pôde recriar as cenas que, estas sim, abalaram a sociedade gaúcha.

No prefácio de Caso Kliemann – A história de uma tragédia, disse outro escritor do primeiríssimo time, Luiz Antonio de Assis Brasil:

“O Rio Grande precisava deste livro para acertar contas com seu passado.”

Transcrito do Jornal da ImprenÇa. Leia mais

Moacir Japiassu fala sobre “Concerto Para Paixão e Desatino”

Moacir Japiassu
Moacir Japiassu

 

1. O livro “Concerto Para Paixão e Desatino – Romance de Uma Revolução Brasileira”, de que forma está estruturado, basicamente?

Moacir Japiassu– Narrado na terceira pessoa, com 45 capítulos, o livro tem 383 páginas. Tremendo calhamaço, né mesmo? Porém, acredito que é de fácil leitura, apesar da linguagem um pouco “trabalhada”, como se diz. Mantive apenas (e aqui discordo do meu Mestre José Américo, que gostava do português com todos os rr e ss, independentemente de classe social), mantive o linguajar do povo. Não o considero como algo desprezível, anti-literário. Pelo contrário, entendo-o como uma espécie de dialeto, riquíssimo em suas epênteses e prosopopéias. No meu livro, creio que existe harmonia entre o português clássico, às vezes arcaico, posto que fui buscar alguma coisa das Cantigas d’Amigo, e o dialeto a que me referi. Convivem “pacificamente”.

Confesso que, em princípio, fui assaltado pela disposição de escrever um roman à clef, mas mudei de idéia ao verificar que não teria o menor sentido dar nomes falsos a alguns personagens reais. Por que eu iria, por exemplo, descrever Zé Américo, expor fases de sua biografia e chamá-lo de Joaquim? Ou dar à Paraíba o nome de Felipéia, governada em 1930 por Baltazar Esteves Mejia? Não, de modo algum; prefiro correr os riscos da intolerância, da incompreensão. E tais riscos são enormes, haja vista a forma como o público encara os atores de telenovelas; alguns são agredidos na rua porque são confundidos com os perversos personagens que interpretam… Você pode argumentar que um livro como o meu, com uma linguagem às vezes rebuscada, não iria interessar ao público das telenovelas; sei não, sei não. Como dizia minha Tia Cota, que o Senhor a tenha, a gente nunca sabe. Principalmente na Paraíba, onde ainda inflamam-se as paixões políticas.

Todavia, como disse, prefiro enfrentar os riscos a me esconder junto com meus personagens, que são muitos, muitíssimos. Gosto de trabalhar com “grande elenco”, como ficou claro no meu romance anterior, “A Santa do Cabaré”, que reúne figuras de minha infância, em João Pessoa e no interior de Pernambuco, terra de minha mãe. Os mais jovens talvez não conheçam a figura, mas os veteranos, os sessentões, sabem muitíssimo bem quem foi Doutor Meira no “folclore sexual” da Paraíba. Pois Doutor Meira é personagem importante de “A Santa do Cabaré”; ele rouba as cenas alheias; chupa-as, melhor dizendo…

Bom, desculpe estar fazendo propaganda da “Santa”, porque o assunto aqui é o “Concerto”. Abundam personagens nessas 383 páginas, mais ou menos agrupados em “núcleos” que se interligam e se confundem no decorrer da narrativa. Não consigo escrever romances que fujam dessa “estratégia”, numa linha que apaixonava escritores como Roger Martin du Gard (Os Thibault) e John Steinbeck (A Leste do Éden), dentre muitos que apreciavam trabalhar pesadamente suas tramas e cenários. As telenovelas costumam usar e abusar dos “núcleos” e por termos esse parentesco é que acredito no interesse do grande público por um romance como o meu. Tudo depende, porém, de divulgação. A divulgação das editoras costuma ser muito ruim, se você não é um autor famoso. Aí, caímos num lamentável círculo vicioso: não se divulga porque o escritor não é famoso; e sem divulgação ele jamais ficará conhecido…

2. “Concerto Para Paixão e Desatino” é um romance que tem como base os episódios que culminaram com a Revolução de 30, inclusive o assassinato de João Pessoa. Como os fatos históricos são transpostos para o terreno da ficção nesta sua obra?

Há uma serena e “natural” interação entre os personagens criados e os da vida real. Se estamos em 1930 (embora o romance tenha início em 1920, durante o Governo de Solon de Lucena) e alguém procura uma autoridade, esta pode ser o Presidente do Estado ou o Secretário de Segurança Pública. Surgem, então, João Pessoa ou Zé Américo. Ou Juarez Távora, nos dias que antecedem a Revolução. Entretanto, faço este imperioso, fundamental esclarecimento: meu livro não é, de modo algum, um compêndio de historiografia paraibana; trata-se de um romance. É ficção, ficção que tem como cenário, como “pano de fundo”, os acontecimentos de 1930. João Pessoa, Zé Américo e os demais são tratados como personagens literários. O autor não mente; procura acompanhar de perto as ações da vida real, da História, mas se reserva o direito de criar roteiros diversos para cada uma dessas vidas tão importantes e tão conhecidas. O recurso do flashback permite ao autor reconstruir o passado que interessa à trama e a ele recorro porque sempre achei de profunda beleza imaginar alguém que se chega à janela, observa a paisagem e esta o remete a um passado feliz, ou infeliz, ou trágico. A solidão do personagem está, no meu livro, sempre recheada de passado.

Há uma cena, da qual gosto sobremaneira, que apresenta Zé Américo no papel de Secretário de Segurança, a fazer uma devassa no escritório que João Pessoa mantinha em sua casa da Praça da Independência. Ora, eu vivi ali naquele cenário, a jogar as peladas de minha infância, quando os moleques saíamos do Colégio Pio X para a liberdade das ruas. Passávamos defronte à mansão em que vivera o Presidente. Observávamos as janelas sempre fechadas, a resguardar que mistérios? Pois eu tive a petulância de abrir uma dessas janelas, por onde Zé Américo nos observa com seus olhos míopes e seu rosto severo…

José Américo e Juarez Távora
José Américo e Juarez Távora

3. Na obra você faz uma advertência ao leitor, situando a presença de José Américo de Almeida (então secretário de Segurança do Governo João Pessoa) nas páginas do romance. Por que a necessidade dessa advertência em relação ao autor de “A Bagaceira”, se outros personagens históricos também são inseridos em sua ficção?

R – O político e escritor José Américo de Almeida talvez seja a maior admiração de minha vida. Quando eu era menino, na João Pessoa do final dos anos 40, meu pai me levava para os comícios dele e eu ficava fascinado com aquela oratória que hipnotizava. É claro que eu não entendia nada do que ele falava, porém era impressionante a forma como dominava a multidão, como emocionava meu pai. “Esse Zé Américo é o cão!”, festejava ele.

Quando, na adolescência, li “A Bagaceira”, entendi melhor por que aquele era um homem especial. Eu estava no tempo das descobertas literárias, morava em Belo Horizonte com a família, meu pai fora transferido (era funcionário do DNOCS) e foi ele quem me deu de presente o romance de Zé Américo.

Agora, já sexagenário, quando fazia as pesquisas necessárias à composição do “Concerto Para Paixão e Desatino”, reli mais uma vez “A Bagaceira” e também as memórias do Mestre e, como revelo na “advertência ao leitor”, assaltou-me crudelíssima dúvida: eu deveria reescrever os trechos que gostaria de aproveitar, apropriando-me disfarçadamente do trabalho de Zé Américo, ou seria mais honesto mantê-lo intacto, já que se trata de texto brilhante, a dispensar reparos? Escolhi este caminho; onde foi possível, mantive os trechos entre aspas; e as dispensei, naqueles parágrafos que pediam mudança de tratamento, da primeira para a terceira pessoa. Quem conhece as memórias de Zé Américo identificará claramente os enxertos. Gostei do resultado; o que poderia ser uma apropriação indébita se transformou na homenagem que eu gostaria de prestar.

4. Em determinado trecho desta advertência, o senhor cita José Américo como personagem fundamental da Revolução. O mesmo se aplica em relação ao papel de José Américo em “Concerto Para Paixão e Desatino”?

R – José Américo é, como todos sabem, personagem fundamental da Revolução de 30 e, como personagem do meu romance, mantém tal excelência, como detalhei acima. Aliás, os leitores do Correio das Artes hão de concordar comigo: a figura de José Américo, sua autoridade expressa no olhar de míope, que transmitia certo distanciamento do interlocutor, é muito literário. O cargo de Secretário de Segurança Pública numa época tão conturbada; o papel dele na campanha de Princesa; a amizade tão estreita com João Pessoa, fazem-no perfeito para um desempenho marcante nas páginas do livro.

5. No posfácio à obra, José Nêummane Pinto faz uma comparação entre “Concerto Para Paixão e Desatino” e “Os Sertões”, de Euclides da Cunha. Com certeza, são duas obras que remontam a fatos históricos da política brasileira, mas onde o romance de Japiassu se aproxima da narrativa de Euclides da Cunha?

R – Nêumanne, intelectual brilhante, versejador de escol, não encontrou no “Concerto” algum terreno onde pudesse semear licenças poéticas, como, por exemplo, semelhanças com o universo euclidiano. É claro que meu romance, por mais pretensioso que seja, jamais poderia ser comparado a “Os Sertões” nem foi isso o que o posfaciador escreveu; Nêumanne se referiu ao comportamento do sertanejo João Dantas, o qual, nas páginas do livro, planeja com necessária minudência o assassinato de João Pessoa com tiros à queima-roupa, quanto mais não seja porque a arma, um revólver calibre 32 de cano curto, não se prestaria ao tiro à média ou longa distância. Nêumanne “jogou” com a imperícia do autor de “Os Sertões”, improvisado pistoleiro que morreu ao enfrentar de peito aberto o amante de sua mulher, num episódio pra lá de conhecido. Se fosse um sertanejo, como os personagens do sertão que dizia conhecer tão bem, Euclides teria feito o que Dantas fez, 21 anos mais tarde: planejaria o atentado ou então descansaria o rifle na paciência da tocaia pura e simples, porém de eficácia garantida. Se houve “licença poética” Nêumanne a situou entre os exemplos pessoais de Euclides e João Dantas, não entre o “Concerto” e “Os Sertões”. Quem me dera que meu humilde romance pudesse ser comparado a umas duas páginas da obra-prima de Euclides!

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João Dantas assassinado na Casa da Detenção do Recife
João Dantas assassinado na Casa da Detenção do Recife

 

Poetisa Anayde Beiríz, amante de João Dantas, suicidada e enterrada no Recife como indigente
Poetisa Anayde Beiríz, amante de João Dantas, suicidada e enterrada no Recife como indigente

6. Nêumanne destaca, ainda, a “forma musical” utilizada no romance, fato também mencionado pelo senhor na advertência ao leitor. Gostaria de saber um pouco mais sobre essa cadência da prosa de seu romance.

R – Um dos personagens que dão sustentação ao romance é um padre, Argemiro Sabaó, pároco de São Miguel de Taipu (ele e José Américo foram colegas de seminário). Sabaó é um grande estudioso da língua portuguesa, colaborador de filólogos como os mestres José Joaquim Nunes e Carolina Michaëlis de Vasconcelos. Os estudiosos do idioma conhecem a dupla. Assim, como homenagem à cultura desse homem tão simples e tão sacrificado, achei de bom alvitre e de excelso respeito ornamentar o texto com frases de inspiração camoniana sempre que Sabaó aparece em cena. Ele bem merece um refrigério d’alma nos instantes em que se agrava o isolamento ante tão desditosa liça (esta última frase é um exemplo da linguagem à qual se refere o Nêumanne). E em nenhum momento, creio, me descuidei da musicalidade da língua portuguesa. Não apenas porque sempre fui um cultor dessa musicalidade como também para ser fiel ao próprio romance, entremeado de óperas, sinfonias, concertos, etc. Aliás, o “Concerto” está dividido em três partes, que são chamadas de “movimentos”, como nos concertos musicais: Allegro, Andante e Vivace.

7. Você inclui, no livro, uma bibliografia, onde se misturam textos históricos sobre os episódios de 30 com obras de autores clássicos como Luiz Vaz de Camões e Padre Antônio Vieira. Claro está, que nem todas as obras citadas na bibliografia foram consultadas, mas fica a curiosidade de saber qual a contribuição de Camões e Padre Vieira num livro sobre a Revolução de 30…

R – A contribuição camoniana já está respondida; e a de Vieira explica-se pela grande admiração que o padre Sabaó mantinha por sua obra. Sabia de cor os Sermões e um deles, aquele no qual o Senhor penitencia-se por ter criado o homem, é “declamado” aos fiéis, na missa que o pároco de São Miguel oferece ao Presidente assassinado.

8. Em um dos capítulos do livro (o 11), você narra com riqueza de detalhes os preparativos para o assassinato de João Pessoa. Na narrativa, é mencionado o affair entre João Pessoa e a cantora lírica Carina Malfitani, assunto ainda tabu na Paraíba. Você não teme reações da família do ex-presidente paraibano ao tocar no assunto?

R – Bom, já disse e repito que meu livro é um romance, é ficção, e assim deve ser visto. Troquei o nome da cantora, para não causar nenhum tipo de constrangimento a parentes próximos e distantes. Afinal, há, em flashback, cenas de sexo entre ela e o Presidente da Paraíba, cenas revividas pela “diva” após o assassinato do amante. São, todavia, momentos que escrevi com muito cuidado, escolhendo e sopesando as palavras. É sexo “quente”, porém digno, respeitoso. Não há vulgaridade no meu romance, isso eu posso garantir. No romance anterior, “A Santa do Cabaré”, há lesbianismo e incesto e eu tenho absoluta certeza de que não chocaram nem o mais pudico leitor. Não é possível que, aos 60 anos e depois de uma vida inteira em contato com as palavras, eu não saiba tratar de sexo com um mínimo de respeito ao leitor, não é mesmo? Todavia, se depois de todos os meus cuidados, houver alguma reclamação, poderei responder como Carlos Drummond de Andrade, quando saiu publicado o seu poema “O Sátiro”, em Lição de Coisas. É assim: Hildebrando insaciável comedor de galinha./Não as comia propriamente — à mesa./Possuía-as como se possuem e se matam mulheres./Era mansueto e escrevente de cartório. Dizem que em Itabira existia realmente um Hildebrando, funcionário de cartório e dado àquele feio hábito. Pois o homem procurou os jornais e meteu a boca no mundo; o poeta respondeu-lhe: “retire-se do meu poema!”. É claro que eu não faria isso com a surpreendente veemência do poeta, meu estilo é mais sossegado; eu pediria, encarecidamente, que o(a) atingido(a) deixasse as páginas do meu “Concerto”. Ora, poemas são poemas, romances são romances. É tudo ficção – ou quase tudo. A intimidade do Presidente João Pessoa no meu livro é, obviamente, peça de ficção. Não creio que amigos da família, ou mesmo parentes, reclamem de algo. Não há motivo para tanto.

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João Pessoa assassinado por João Dantas
João Pessoa assassinado por João Dantas

9. A propósito, apesar de ser um romance, seu livro toca fogo num vespeiro, já que até hoje a simples menção ao episódio traz de volta os radicalismos de perrepistas e liberais da política paraibana. Qual a sua expectativa para a leitura que possa se fazer da obra, principalmente na Paraíba?

R – Como me estendi um pouco na resposta acima, creio que esta já está respondida; posso adiantar que o romance também apresenta uma versão, bastante possível, embora improvável, de que João Pessoa talvez tenha sido assassinado a mando de um amigo, um correligionário, companheiro de campanha política, insatisfeito porque o Presidente mostrou-se (e esse fato é verdadeiro, está nas memórias de Zé Américo) contrário à revolução. Se é verdade que toco fogo num vespeiro, não me surpreenderia que fosse nesse trecho do romance. Porém, seria até bom uma polêmica a respeito; as polêmicas acendem o espírito, alumiam a alma…
10. Recentemente, o jornalista paraibano Fernando Melo lançou um livro resgatando a história de João Dantas, o assassino de João Pessoa. No seu livro há alguma tentativa de redimir João Dantas, transformando-o de algoz em vítima?

R – Não, de modo algum. O meu João Dantas, se posso falar assim do personagem do romance, aparece como uma pessoa capaz de ser influenciada por um jornalista, seu amigo dos tempos de Liceu, figura sórdida que deseja a morte do Presidente para aproveitar-se do caos e disseminar a corrução pela Paraíba e o Nordeste. Todas as versões são válidas quando a realidade se perde na obscuridade.
11. A licença poética foi fundamental para transpor personagens históricos como João Pessoa, João Dantas, Ademar Vidal e José Américo de Almeida para as páginas de um texto de ficção?

R – Já me referi a licenças poéticas e disse acima que todas as versões são válidas quando a realidade se perde na obscuridade. Isto é rigorosamente verdadeiro. O que não se pode, em hipótese alguma, é mentir descaradamente sobre um personagem da vida real que se transpôs para a ficção. Eu não poderia dizer, por exemplo, que Zé Américo traiu João Pessoa. Eu teria que provar isso – ou então, deveria mudar o nome do personagem, o que seria um absurdo, conforme já disse.

12. Foi o que você fêz com Ernâni Satyro, que no seu romance aparece com o nome de Libânio?

R – O Libânio do romance é um importador de gado indiano, que percorre inúmeros estados, conhece Deus e o mundo e é um leva-e-traz, um mexeriqueiro, boateiro. O personagem não tem nada de Ernâni Satyro, que era um intelectual, um escritor talentoso, um político de primeiríssimo time. Eu o conheci bem, nos encontramos na Paraíba, quando eu era repórter da revista IstoÉ, e também, por diversas vezes, em Brasília. Certa vez, em Brasília, eu contei a ele a história de um sertanejo dado ao onanismo, autor de uma frase engraçadíssima que não posso, infelizmente, repetir aqui, por respeito às famílias que lêem o Correio das Artes. Ernâni escutou a frase e riu a noite inteira; quanto mais goles de uísque bebíamos, mais ele me pedia para contar a história. E caía na gargalhada. A frase é realmente muito engraçada. Bem. Quando resolvi “rabiscar” o personagem Libânio, o qual, no romance, assume a frase como sua, eu ria e me lembrava de Ernâni. E Libânio acabou ficando, fisicamente – repito: fi-si-ca-men-te – parecido com Ernâni: baixo, “torado no grosso”, óculos de fundo de garrafa de cerveja Teutônia (a Brahma da época), voz tonitruante. Foi por isso que Nêumanne e outros leitores especiais do romance disseram: mas você retratou o Ernâni Satyro! Respondi: fisicamente, sim; o resto, não. Ernâni era, por acaso, vendedor de gado em 1930?!?!?!?!?

13. O Presidente Solon de Lucena também virou seu personagem e, segundo consta, é muito maltratado no romance.
R – Isso é boato de quem não leu o “Concerto”; Solon de Lucena aparece pouco, no início do livro, com os problemas do seu governo, a crise do café, principalmente. Outro personagem, o Senhor-de-Engenho Deba Coutinho, perrepista histórico, tem um entrevero com Solon, porém não é um entrevero político e sim sentimental; Deba “acha” que o Presidente lhe tomou a amante. Todas as dores do corno são atribuídas ao Presidente, porém o narrador em nenhum momento concorda com o personagem. Deba é um neurótico e nada mais.

 

Velório de João Pessoa (em João Pessoa ou Rio de Janeiro) foi a propaganda fúnebre da revolução de Trinta
Velório de João Pessoa (em João Pessoa ou Rio de Janeiro) foi a propaganda fúnebre da revolução de Trinta
Funeral de João Pessoa na Paraíba
Funeral de João Pessoa na Paraíba

14. Apesar de tantos personagens históricos circulando pelas páginas do livro, o personagem principal chama-se Isaías. Quem é esse Isaías e qual o seu papel na trama?

R – Isaías é um menino pobre, morador de um dos engenhos da várzea do Paraíba. Aquele também é cenário de minha infância, ali passei temporadas, no engenho Oiteiro e no Taipu; meu pai foi concebido e criado nos engenhos. Eu sou Moacir Japiassu Lins; quer dizer, tenho raízes fincadas nos bangüês; sou, para minha honra, aparentado com José Lins do Rego. Meu pai, Severino Lins Falcão, era, segundo a memória de todos, “filho natural” de um Senhor-de-Engenho daquele baixo curso do Paraíba. Esse Senhor-de-Engenho, “Seu Lôla”, como era chamado, e também meu pai, são personagens do romance. Volto a Isaías. Este foi criado por Sabaó; diziam que era, na verdade, filho do padre. Quando aparece no livro, logo no início, Isaías tem oito anos de idade, aparenta muito mais, porque é grandalhão, e acaba de perder o pai – o homem que vivia com a mãe dele. Diante da penúria da família, Sabaó aceita criar o menino, que se transforma em seu braço direito, desde as missas, que ajudava a rezar como coroinha e assobiador das músicas sacras, até pesquisador de seu anunciado livro em parceria com o filólogo português José Joaquim Nunes. Isaías, que é também balconista da farmácia, faz o serviço militar no Tiro de Guerra de Itabaiana, utiliza seu tamanho para prestar serviços a um Exército que desconhecia, é óbvio, os direitos humanos fundamentais e, em pleno fulgor da revolução de 30, conhece José Américo por vias transversas. É, modéstia à parte, um bom personagem; um personagem de ficção por excelência e eu me orgulho bastante de o ter concebido.

15. Saindo um pouco do romance, como jornalista e paraibano, qual a sua visão da Revolução de 30 e do assassinato de João Pessoa? Os livros lançados até hoje sobre o assunto conseguiram dar a dimensão correta do episódio, como ocorreu com Canudos através das páginas de Euclides da Cunha?

R – É muito difícil, quase impossível, ter-se a “dimensão correta” da Revolução de 30 na Paraíba; há muitas testemunhas, inúmeros textos apaixonados, e sabe-se que a paixão não é a melhor conselheira de um historiador. Há, sobre os acontecimentos, muitos “desabafos”, assim os podemos chamar; personagens glorificados numa obra são impiedosamente execrados noutra. Entretanto, é exatamente esse espetacular desencontro de opiniões e idéias que transformam aqueles dias num excepcional cenário de romance. Em Canudos, que rendeu uma das maiores obras da literatura brasileira, a única testemunha ocular (e com olhos de escritor) foi Euclides da Cunha. Quando escreveu A Guerra do Fim do Mundo, Mario Vargas Llosa confessou ter-se baseado n’Os Sertões. Tudo o que se fez e venha a ser feito sobre Canudos terá como ponto de partida a obra de Euclides. E olhe que os historiadores têm apontado inúmeras falhas em Os Sertões, falhas que devem existir realmente, pois Euclides não era um historiador e sim o enviado especial do jornal O Estado de S. Paulo. E, definitivamente, não se pode exigir de um escritor e jornalista a precisão metodológica do historiador. Eu embarco nessa canoa e esclareço que também sou jornalista e escritor, mereço tanta indulgência quanto Euclides, e talvez mais, porque não sou testemunha ocular de coisa alguma e as pessoas que assim se apresentam são, como disse, movidas pelo envolvimento pessoal, a emoção.

16. E a Revolta de Princesa? Não é um tema pouco explorado por historiadores, pesquisadores e até ficcionistas?

R – Em meu romance há inúmeras cenas da Revolta de Princesa, através dos depoimentos de Zé Américo, aos quais me refiro na tal “Advertência ao Leitor”. Preferi caminhar pela mão do Mestre porque o texto literário me oferecia beleza e facilidades. Poderia ter bebido doutras cacimbas, como os trabalhos de Inês Caminha Lopes Rodrigues, Ademar Naziazene, José Gastão Cardoso, José Leal, dentre outros, mas me convenci de que acabaria me confundindo, sem nenhum refrigério; afinal, eu não estava escrevendo História, simplesmente utilizava acontecimentos históricos como cenário de ficção. Sinto falta, como jornalista e, principalmente, como leitor, de uma obra que esgotasse o assunto. Isso é tarefa para um historiador com o nível do José Octávio de Arruda Melo, por exemplo. O livro dele A Revolução Estatizada – Um Estudo Sobre a Formação do Centralismo em 30, brilhantíssimo estudo acadêmico (tese de Mestrado na Universidade Federal de Pernambuco), é base natural de uma obra maior que está pedindo para ser escrita. José Octávio é o profissional talhado para desempenhar tal missão; tem todos os recursos do moderno historiador e ainda escreve muito bem.

 

Um belo presente de Natal. OS PRINCIPAIS ROMANCES DE MOACIR JAPIASSU E O JORNAL DA IMPRENçA

Moacir Japiassu
Moacir Japiassu

 

Toda semana dedico um dia para ler o Jornal da ImprenÇa de Moacir Japiassu, que tem o humor fino de Machado de Assis (que, por sua vez, no apreciar dos críticos, possuía o humor inglês de Swift a Sterne).

A coluna do mestre Japi está sempre repleta de preciosidades. Veja algumas pérolas deste semana:

 

Tu és o quelso do pental ganírio,

saltando as rimpas do fermim calério

carpindo as taipas do furor salírio

nos rúbios calos do pijom sidério.

(Luís Lisboa, poeta maranhense, inA Uma Santa. A íntegra está no Blogstraquis.)

 

Passado corrigido

Comentário que o considerado Carlos Alberto Sardenberg, velho amigo e companheiro na Istoé dos anos 1970, fez no Jornal da Globo:

A presidente deu uma informação errada quando, na semana passada, disse que o PIB de 2012 seria corrigido de crescimento de 0,9% para 1,5%. Na terça, o IBGE de fato corrigiu, mas para 1%, quase nada.

Comenta o jornalista João Borges, da GloboNews:

‘O governo, que já errava as previsões sobre o futuro, agora também erra as previsões sobre o passado.’

Premonição

Do considerado Fernando Gabeira, outro que não precisa de apresentação, velho amigo e companheiro no Correio de Minas de 1962,  em artigo no Estadão:

(…) Nunca me esquecerei de um homem da minha cidade conhecido como “Antônio me abraça”. Ele entrou numa casa de apostas que irradiava uma corrida de cavalos e disse sobre o tordilho que liderava a prova: “Só perde se quebrar a perna”. Pois quebrou.

Pisam na língua

língua

O considerado Luiz Fernando Perez, um dos melhores jornalistas do Brasil, velho amigo e companheiro no Correio de Minas de 1962, remete de seu escritório na Praça da Savassi, em Belo Horizonte:

Veja, na notícia divulgada nesta quinta-feira pelo portal do Estadão, como os redatores ignoram a concordância verbal, no título e no texto:

‘Apenas 2,5% dos paulistanos vive em locais com índice de urbanismo máximo

TV Estadão  — Um estudo feito pelo Estadão Dados com base nos dados do Censo 2010 do IBGE, mostram que os sortudos que vivem em locais com taxa de urbanismo máxima estão espalhados pela cidade, mas a maioria está no centro expandido e em bairros mais ricos, como Consolação e Jardim Paulista.’

Estão sempre pisando na língua: num curto espaço, ‘2,5% dos paulistanos vive’ e ‘Um estudo… mostram’…

Sinistras

O considerado Armando Salém, jornalista do mais alto nível, amigo e companheiro na Istoé dos anos 1970, despacha de seu escritório na região da Av.Paulista, esta, como se diz, coletânea de “frases sinistras”. Algumas percorrem a internet há algum tempo e outras são novíssimas. Experimente algumas e conheça as demais no Blogstraquis:

… Liquidação de Muletas – Aproveite, venha correndo!

… Mamãe, por que você bateu naquela mulher que a gente viu chorando no túmulo do papai?

… O amor é a gasolina da vida. Custa caro, acaba rápido e pode ser substituída pelo álcool…

… Ex-namorado é que nem vestido: você vê em foto antiga e não acredita que teve coragem de um dia sair com aquilo!

… Eu sempre quis ter o corpo de um atleta. Graças ao Ronaldo Fenômeno isso já é possível!

… Espermatozóides se cumprimentando: e aí, seu porra?!

… Troque seu coração por um fígado, assim você se apaixona menos e bebe mais…

 ***** 

Nota do redator do blogue: Minha adjetivação arriba visa provocar o mestre Japiassu, o maior romancista brasileiro da atualidade.

Sei que ele detesta o jornalismo apressado, tipo meus improvisos.

Neste Natal, dê um romance de Moacir Japiassu de presente.

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Nossas livrarias não vendem autores brasileiros. Compre aqui, ou solicite informações.

 

 

 

Famiglia Perrella

por Moacir Japiassu

Perrella

Diretor de nossa sucursal no DF, químico que trabalhou mais de 30 anos na Petrobrás, jornalista e escritor, maior ombudsman da imprensa brasileira, o considerado Roldão Simas Filho envia da sede brasiliense desta coluna, edifício já decadente, de cujo varandão desbeiçado sobre as biografias não autorizadas vê-se o ir-e-vir de risonhos mensaleiros, pois nosso Mestre, como eu dizia, despacha para cá um e-mail recebido de velho amigo muito bem informado:

Caro Simas,

O Zezé Perrella não é flor que se cheire.

Aliás, pelo que sei, Perrella não é nome de sua família, mas de um frigorífico aqui de Belo Horizonte, onde ele trabalhava. Era o Zezé do Perrella, daí a incorporação do nome. Coisa parecida com a do Sir Ney.

Pelo que se diz, ficou rico quando passou a fazer parte da direção do Cruzeiro (em especial como presidente), quando teria ganho muito dinheiro através de venda de atletas do clube. Também, entrou na “carreira política” visando foro privilegiado.

Como tal pai tal filho, o filhote segue os rumos do pai.

(Como todos estamos carecas de saber, o senador Zezé Perrella e o filho dele, deputado estadual Gustavo Perrella, tiveram o helicóptero da “famiglia” apreendido com 445 quilos de drogas.)