
Todo esse pranto, toda essa dor pela perda do esposo não nos deve impressionar, insensíveis que nos tornamos. Nas sociedades pré-industriais, as pessoas sentiam as coisas muito mais intensamente do que nós hoje. Embrutecemos. O historiador Johan Huizinga (1872-1945), há quase cem anos, em sua famosa obra O Outono da Idade Média (1919) já alertara para a notável sensibilidade à flor da pele das culturas antigas, dos medievais: tudo era muito mais sentido, sofrido e regozijado.
Segundo o colunista Janio de Freitas, ao demorar para anunciar seu apoio a Aécio Neves (PSDB), Marina Silva “instalou a implosão em dois partidos”: “proporcionou tempo para que uma ala do PSB, com o estandarte da viúva de Eduardo Campos, articulasse o abandono da linha tradicional do partido, de centro-esquerda”, e um racha de parte da Rede, que considerou a adesão “grave erro” e contrária ao projeto original
247 – O colunista Janio de Freitas atribui a Marina Silva o apelido de “divisora”. Segundo ele, ao ‘espichar as atenções por mais uns dias sobre sua posição no 2° turno, ela instalou a implosão em dois partidos’.
No PSB, diz que ela proporcionou tempo para que uma ala, com o estandarte da viúva de Eduardo Campos, articulasse o abandono da linha tradicional do partido, de centro-esquerda, e a necessária derrubada dos dirigentes mais identificados com sua formação.
Quanto a Rede, lembra que parte da sigla considerou adesão a Aécio, decidida por Marina, “grave erro” e contrária ao “projeto original”, ao torná-la “parte da polarização PT x PSDB”.
Marina Divisora

por Janio de Freitas
A adesão de Marina Silva a Aécio Neves é o seu caminho convencional, mas, para formular os argumentos vazios que invocou, não precisava de tantos dias, bastavam minutos. Além disso, Marina já tem convivência bastante com a política para saber que nenhuma condição exigida de Aécio tem valor algum: se eleito e por ela cobrado, não esqueceria o velho refrão político “as circunstâncias mudaram”. Ao espichar as atenções por mais uns dias, no entanto, Marina instalou a implosão em dois partidos. Um feito, sem dúvida.
A demora de Marina proporcionou tempo para que uma ala do Partido Socialista Brasileiro, com o estandarte da viúva de Eduardo Campos, articulasse o abandono da linha tradicional do partido, de centro-esquerda, e a necessária derrubada dos dirigentes mais identificados com o PSB. Novo rumo: adesão a Aécio.
Em termos partidários, é como se o PSB fosse extinto, com uma descaracterização que preserva apenas o nome e a sigla. Não de todo, aliás, com o humor já se referindo ao “novo PV”: não de Partido Verde, mas Partido da Viúva.
O manifesto “A favor da nova política” tem argumentos consideráveis e reúne, em corrente própria, os que se integraram à Rede Sustentabilidade, partido de Marina, para construir novos modos de fazer política. E consideram a adesão a Aécio, decidida por Marina, “grave erro” e contrária ao “projeto original da Rede Sustentabilidade”, ao torná-la “parte da polarização PT x PSDB”. A adesão agrava-se porque Aécio, diz o manifesto, tem “integração orgânica à desconstituição de direitos, aos ruralistas e ao capital financeiro”, três frentes a que a Rede se opõe por princípio.
Para contornar a reação de correligionários valiosos, Marina Silva precisará de argumentos melhores do que lhe bastaram para aderir ao candidato do PSDB, em vez de “rejeitar as duas candidaturas”. Rede se remenda. O PSB, não.
Apoio a Aécio provoca debandada na cúpula da Rede

Jornal GGN – Sete coordenadores do Rede Sustentabilidade em São Paulo saíram do partido em protesto à adesão de Marina Silva à candidatura de Aécio Neves. São eles os coordenadores executivos Valfredo Pires e Marcelo Pilon; os coordenadores de comunicação Emílio Franco e Renato Ribeiro; os coordenadores de finanças Gérson Moura e Marcelo Saes e o coordenador de organização Washington Carvalho.
Na parte mais dura do manifesto, o grupos salienta que “As nossas esperanças de um Brasil mais justo, mais ético e mais sustentável mostraram-se como mercadorias, à venda por promessas que não surtirão resultados a médio e a longo prazo”.
Folha de S. Paulo (por Gustavo Uribe) – Em carta, sete coordenadores do partido pediram renúncia de suas atribuições
No texto, o grupo afirma que o apoio a qualquer um dos candidatos à sucessão presidencial neste segundo turno reforça a polarização entre PT e PSDB, criticada pela Rede no primeiro turno da disputa eleitoral.
Em uma crítica ao PSDB, o grupo afirma que não pode servir indiretamente a um projeto de poder que “já foi testado” e com o qual não concorda. Ele ressalta ainda que não responderá pelo “assassinato” de ideais e princípios que o atraíram à Rede.
“No primeiro turno, a Rede tinha como discurso sair da polarização entre PSDB e PT. E, agora, quebra-se essa posição”, criticou Pires.
“Traição à luta”

O presidente nacional do PSB, Roberto Amaral, divulgou neste sábado (11) uma carta aberta em que apoia a reeleição de Dilma Rousseff (PT) e afirma que seu partido “traiu a luta” do ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos ao se aliar a Aécio Neves (PSDB).
Amaral diz na carta que ao se aliar “acriticamente” à candidatura Aécio Neves, o bloco que controla o partido “renega compromissos programáticos e estatutários” e “joga no lixo o legado de seus fundadores”.
“Ao aliar-se à candidatura Aécio Neves, o PSB traiu a luta de Eduardo Campos, encampada após sua morte por Marina Silva, no sentido de enriquecer o debate programático pondo em xeque a nociva e artificial polarização entre PT e PSDB.”
Por vingança, dentro do PSB, um grupo de dirigentes em Pernambuco pretende tirar Roberto Amaral da presidência da sigla. O mais cotado para o cargo seria o gaúcho Beto Albuquerque, líder da bancada ruralista na Câmara dos Deputados,e lobista das empresas de fumo, armas e transgênicos, que concorreu como vice de Marina, que se declarou herdeira da Campos e viúva.
Leia abaixo a íntegra da carta aberta:
“Mensagem aos militantes do PSB e ao povo brasileiro
A luta interna no PSB, latente há algum tempo e agora aberta, tem como cerne a definição do país que queremos e, por consequência, do Partido que queremos. A querela em torno da nova Executiva e o método patriarcal de escolha de seu próximo presidente são pretextos para sombrear as questões essenciais. Tampouco estão em jogo nossas críticas, seja ao governo Dilma, seja ao PT, seja à atrasada dicotomia PT-PSDB – denunciada, na campanha, por Eduardo e Marina como do puro e exclusivo interesse das forças que de fato dominam o país e decidem o poder.
Ao aliar-se acriticamente à candidatura Aécio Neves, o bloco que hoje controla o partido, porém, renega compromissos programáticos e estatutários, suspende o debate sobre o futuro do Brasil, joga no lixo o legado de seus fundadores – entre os quais me incluo – e menospreza o árduo esforço de construção de uma resistência de esquerda, socialista e democrática.
Esse caminhar tortuoso contradiz a oposição que o Partido sustentou ao longo do período de políticas neoliberais e desconhece sua própria contribuição nos últimos anos, quando, sob os governos Lula dirigiu de forma renovadora a política de ciência e tecnologia do Brasil e, na administração Dilma Rousseff, ocupou o Ministério da Integração Nacional.
Ao aliar-se à candidatura Aécio Neves, o PSB traiu a luta de Eduardo Campos, encampada após sua morte por Marina Silva, no sentido de enriquecer o debate programático pondo em xeque a nociva e artificial polarização entre PT e PSDB. A sociedade brasileira, ampla e multifacetada, não cabe nestas duas agremiações. Por isso mesmo e, coerentemente, votei, na companhia honrosa de Luiza Erundina, Lídice da Mata, Antonio Carlos Valadares, Glauber Braga, Joilson Cardoso, Kátia Born e Bruno da Mata, a favor da liberação dos militantes.
Como honrar o legado do PSB optando pelo polo mais atrasado? Em momento crucial para o futuro do país, o debate interno do PSB restringiu-se à disputa rastaquera dos que buscam sinecuras e recompensas nos desvãos do Estado. Nas ante-salas de nossa sede em Brasília já se escolhem os ministros que o PSB ocuparia num eventual governo tucano. A tragédia do PT e de outros partidos a caminho da descaracterização ideológica não serviu de lição: nenhuma agremiação política pode prescindir da primazia do debate programático sério e aprofundado. Quem não aprende com a História condena-se a errar seguidamente.
Estamos em face de uma das fontes da crise brasileira: a visão pobre, míope, curta, dos processos históricos, visão na qual o acessório toma a vez do principal, o episódico substitui o estrutural, as miragens tomam o lugar da realidade. Diante da floresta, o medíocre contempla uma ou outra árvore. Perde a noção do rumo histórico.
Ao menosprezar seu próprio trajeto, ao ignorar as lições de seus fundadores – entre eles João Mangabeira, Antônio Houaiss, Jamil Haddad e Miguel Arraes –, o PSB renunciou à posição que lhe cabia na construção do socialismo do século XXI, o socialismo democrático, optando pela covarde rendição ao statu quo. Renunciou à luta pelas reformas que podem conduzir a sociedade a um patamar condizente com suas legítimas aspirações.
Qual o papel de um partido socialista no Brasil de hoje? Não será o de promover a conciliação com o capital em detrimento do trabalho; não será o de aceitar a pobreza e a exploração do homem pelo homem como fenômeno natural e irrecorrível; não será o de desaparelhar o Estado em favor do grande capital, nem renunciar à soberania e subordinar-se ao capital financeiro que construiu a crise de 2008 e construirá tantas outras quantas sejam necessárias à expansão do seu domínio, movendo mesmo guerras odientas para atender aos insaciáveis interesses monopolísticos.
O papel de um partido socialista no Brasil de hoje é o de impulsionar a redistribuição da riqueza, alargando as políticas sociais e promovendo a reforma agrária em larga escala; é o de proteger o patrimônio natural e cultural; é o de combater todas as formas de atentado à dignidade humana; é o de extinguir as desigualdades espaciais do desenvolvimento; é o de alargar as chances para uma juventude prenhe de aspirações; é o de garantir a segurança do cidadão, em particular aquele em situação de risco; é o de assegurar, através de tecnologias avançadas, a defesa militar contra a ganância estrangeira; é o de promover a aproximação com nossos vizinhos latino-americanos e africanos; é o de prover as possibilidades de escolher soberanamente suas parcerias internacionais. É o de aprofundar a democracia.
Como presidente do PSB, procurei manter-me equidistante das disputas, embora minha opção fosse publicamente conhecida. Assumi a Presidência do Partido no grave momento que se sucedeu à tragédia que nos levou Eduardo Campos; conduzi o Partido durante a honrada campanha de Marina Silva. Anunciados os números do primeiro turno, ouvi, como magistrado, todas as correntes e dirigi até o final a reunião da Comissão Executiva que escolheu o suicídio político-ideológico.
Recebi com bons modos a visita do candidato escolhido pela nova maioria. Cumprido o papel a que as circunstâncias me constrangeram, sinto-me livre para lutar pelo Brasil com o qual os brasileiros sonhamos, convencido de que o apoio à reeleição da presidente Dilma Rousseff é, neste momento, a única alternativa para a esquerda socialista e democrática. Sem declinar das nossas diferenças, que nos colocaram em campanhas distintas no primeiro turno, o apoio a Dilma representa mais avanços e menos retrocessos, ou seja, é, nas atuais circunstâncias, a que mais contribui na direção do resgate de dívidas históricas com seu próprio povo, como também de sua inserção tão autônoma quanto possível no cenário global.
Denunciamos a estreiteza do maniqueísmo PT-PSBD, oferecemos nossa alternativa e fomos derrotados: prevaleceu a dicotomia, e diante dela cumpre optar. E a opção é clara para quem se mantém fiel aos princípios e à trajetória do PSB.
O Brasil não pode retroagir.
Convido todos, dentro e fora do PSB, a atuar comigo em defesa da sociedade brasileira, para integrar esse histórico movimento em defesa de um país desenvolvido, democrático e soberano.
Rio de Janeiro, 11 de outubro de 2014.
Roberto Amaral“