
BIRA ROCHA
Empresário
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A respeito de meu artigo, “Mal feito premiado”, recebi o seguinte comentário do Desembargador Federal Marcelo Navarro Ribeiro Dantas, pessoa a quem dedico apreço e admiração:
Bira,
Sou seu leitor e seu admirador, mas seu artigo de sexta-feira passada, 6 de abril, contém alguns equívocos que é preciso desfazer.
Diz ele que a maior punição que um magistrado pode receber é a aposentadoria por tempo integral, o que você considera, não sem alguma razão, mais prêmio que sanção.
E conclui:
“É um privilégio totalmente descabido para o atual estágio de desenvolvimento da sociedade brasileira em que os direitos são iguais, entre todos os cidadãos…
…
Só que não é assim, com todo respeito.
Não existe um só dispositivo na Constituição da República que diga isso.
Não existe lei nenhuma dando respaldo a seu artigo, nesse ponto.
Ao contrário. A LOMAN – Lei Orgânica da Magistratura Nacional prevê, como sanções disciplinares para os magistrados (art. 42), numa escala que vai da mais leve à mais grave: advertência; censura; remoção compulsória; disponibilidade com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço; aposentadoria compulsória com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço; e demissão (grifo meu).
Portanto, não tem essa de aposentadoria compulsória sempre integral. Vai tê-la o magistrado, mesmo punido com essa sanção, que já tiver tempo suficiente, não aquele que ainda não o integralizou.
Outro ponto a esclarecer: você diz que, se um magistrado erra e causa dano, e o cidadão lesado ingressa com uma ação e ganha, quem paga a indenização é o Erário, e não o magistrado. É. Porém isso vale para qualquer agente público, seja juiz ou não. Está na constituição: art. 37, § 6.º, e é muito bom para o cidadão que seja assim, porque litigando apenas contra o Estado, o cidadão só precisa provar a ação ou omissão, o nexo de causalidade e o dano. Se litigasse contra o agente público, além disso tudo, teria de comprovar a culpa ou dolo deste, o que é complicado.
Eu, seguindo opinião de muitos juristas, acho até que o cidadão, querendo, podia litigar desde logo contra o Estado e o agente causador do dano. Mas o STF – Supremo Tribunal Federal já pacificou que tem de ser só contra o ente público, que poderá, posteriormente, acionar o agente (é o chamado direito de regresso). O único problema é que tais ações regressivas muitas vezes não são propostas, mas isso não é responsabilidade dos juízes, e sim dos gestores públicos e da advocacia pública…
De todo jeito, o magistrado ocasionador de possível prejuízo ao Erário (como qualquer outro agente público, repita-se), está sujeito a uma ação de regresso para repor financeiramente tal lesão.
Mas o maior engano em que incide seu artigo é dar a entender que a aposentadoria compulsória é a única pena que pode ser aplicada aos juízes.
Não!
Isso é uma lenda urbana, altamente nociva à magistratura e ao Judiciário, que de tão repetida está ganhando foros de verdade…
Os magistrados (juízes, desembargadores, ministros dos tribunais superiores e até do Supremo), além das punições disciplinares de suas corregedorias, conselhos, entre os quais (exceto para os integrantes do STF) o CNJ – Conselho Nacional de Justiça — que só pode aplicar penalidades administrativas, registre-se —, estão sujeitos a todos os artigos tanto do Código Civil como do Código Penal e de qualquer lei instituidora de sanções!
O juiz é um cidadão igual aos demais.
Se a infração que cometer for apenas administrativa, ele recairá numa daquelas sanções a que me referi, entre as quais a aposentadoria compulsória proporcional.
Se, além de administrativa, essa infração também constituir ilícito civil, ele, cumulativamente, poderá sofrer as sanções civis respectivas (de improbidade, por exemplo; de inelegibilidade; de caráter indenizatório, etc.).
E, se ademais disso tudo, dita infração configurar ilícito penal (delito), ele, também cumulativamente, poderá sofrer as penas criminais cabíveis (inclusive detenção e reclusão, isto é, cadeia!), e perder até mesmo a possível aposentadoria que tenha conseguido com a punição administrativa…
Você pode achar — a liberdade de opinião é sagrada — que são poucos os magistrados punidos com cadeia. Mas também não são tantos os membros de outros poderes nessa situação.
O que não é possível, com todo respeito, é afirmar que existe um privilégio só para o Judiciário e só no Brasil.
Não. As prerrogativas da magistratura (e também do Ministério Público), que existem na maioria dos países democráticos, são garantias mais do cidadão que do magistrado.
Afinal, se o juiz não tiver garantias, como poderá ter independência e altivez para decidir — se for o caso — contra os poderes constituídos (mesmo o seu!), ou contra os poderes informais, como os poderes econômicos e de comunicação social?
Na verdade, o único privilégio do Judiciário, ultimamente, tem sido apanhar na imprensa. Quando merece, é o jeito; danado é apanhar mesmo quando não está errado.
Se quem bate são pessoas sem qualificação, ou de má-fé, nem adianta responder. Mas quando vejo alguém do seu nível e da sua seriedade repetindo e propagando equívocos, vale a pena tentar fazer um esclarecimento.
Com o apreço e a estima que você conhece,
Marcelo Navarro Ribeiro Dantas.
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Comentário do Editor:
Dos tempos que conheci o poeta Newton Navarro e o político Odilon Ribeiro Coutinho, amigo de Newton e da poetisa Zila Mamede, e até o final do século passado, o povo não desacreditava da Justiça Justiça.
Nunca existiu esta tal de “lenda urbana”.
Até o ministro “Gilmar Mendes quer mudanças na lei que pune magistrados”.
Eis o que informa a OAB:
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes afirmou que é possível discutir novas sanções para magistrados condenados por irregularidades. Mas, ao contrário da corregedora do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Eliana Calmon, disse considerar a aposentadoria compulsória – pena máxima para juízes condenados por corrupção – uma punição, e não um prêmio.
Na semana passada, a corregedora defendeu que juízes sejam multados e devolvam valores obtidos com a venda de sentenças e outras ilegalidades.
“Dizem que isso (aposentadoria compulsória) acaba sendo um prêmio. Não é prêmio. A comunidade sabe que o sujeito foi afastado por ato de improbidade. É uma pena grave. Isso não afasta o processo judicial que leva à perda da própria aposentadoria, mas é possível, sim, discutir novos modelos, novas sanções, até porque o rol (de punições previstas), de número fechado, é pouco significativo”, disse Mendes, em seminário sobre arbitragem promovido pelo jornal Valor Econômico , nesta segunda-feira, dia 28, em São Paulo.
Segundo o ministro, o STF deve priorizar a conclusão do anteprojeto da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman) para ir a votação no Congresso. Ele espera que isso ocorra em 2012. O ministro disse que não sabe se concorda com a ideia de Eliana Calmon de multar juiz corrupto: “Mas pode ser discutido”.
Confira a fonte
“Os magistrados (juízes, desembargadores, ministros dos tribunais superiores e até do Supremo), além das punições disciplinares de suas corregedorias, conselhos, entre os quais (exceto para os integrantes do STF) o CNJ – Conselho Nacional de Justiça — que só pode aplicar penalidades administrativas, registre-se —, estão sujeitos a todos os artigos tanto do Código Civil como do Código Penal e de qualquer lei instituidora de sanções!” Que assim seja!!!