MORO, O JUIZ DO VERBO NO CONDICIONAL. O JUIZ DO QUIÇÁ, QUIÇÁ, QUIÇÁ: SE ME PERGUNTAM SE UM PETISTA ALGUM CRIME ESCONDE, LOGO ME RESPONDO: TALVEZ, TALVEZ, TALVEZ. DEVE SER PRESO, SIM, PORQUE É POSSÍVEL, PODERIA, PORVENTURA TER RECEBIDO PROPINA ATÉ QUE PROVE SUA INOCÊNCIA.
A semanticista Fátima Oliveira, in Gramática da Língua Portuguesa, Lisboa, Caminho (pp. 256-257), defende que o condicional funciona mais frequentemente como um modo do que como um tempo, em especial nas situações em que o ponto de referência temporal não é o passado. Nos exemplos vi e vii, pode constar-se que é a dimensão modal da probabilidade, da hipótese, que é expressa pelo condicional. Na qualidade de modo, o condicional exprime o irreal, um desejo, ou a atenuação de uma afirmação.
Jornal GGN – Em sua coluna na Folha de S. Paulo, o jornalista Janio de Freitas questiona a 23a fase da Operação Lava Jato e as acusações de que o marqueteiro João Santana recebeu propinas da Odebrecht, já que ele não teria relação com a intermediação de contratos da Petrobras. Janio também afirma que o juiz Sergio Moro e os procuradores da força tarefa não levantaram indícios de que o dinheiro da construtora no exterior teria sido proveniente da Petrobras. “A falta até de mínima sustentação das exposições de Sergio Moro, no próprio decreto de prisão de Santana e Mônica, como nas falas dos procuradores e policiais é nada menos do que escandalosa”, diz o colunista. Leia mais abaixo:
Efeitos secundários
por Janio de Freitas
Um mistério, mas nem tanto. O juiz Sergio Moro expôs por escrito, os procuradores falaram à vontade, representantes da Polícia Federal falaram também, mas ninguém disse o essencial para dar sentido a essa operação 23 da Lava Jato: por que, afinal de contas, o marqueteiro João Santana “recebeu propina” US$ 3 milhões da Odebrecht, se nada tem a ver com intermediação de contratos da Petrobras, nem se sabe de outras atividades suas que expliquem comissões da empreiteira?
Também não há, nas tantas palavras daquelas vozes da Lava Jato, nenhum indício, consistente ou não, de que o dinheiro da Odebrecht no exterior seja proveniente da Petrobras, como “desconfiam”. Nem que tenha qualquer relação com campanha no Brasil.
A falta até de mínima sustentação das exposições de Sergio Moro, no próprio decreto de prisão de Santana e Mônica, como nas falas dos procuradores e policiais é nada menos do que escandalosa. Ou deveria sê-lo.
O jornalista Fernando Molica levantou, para sua coluna no carioca “O Dia”, o uso de determinadas palavras no decreto de prisão do casal. Sergio Moro diz ser algo “possível” 19 vezes. “Já ‘possivelmente’ foi escrita em 3 ocasiões, ‘provável’ em 5. Moro utilizou alguns verbos no futuro do pretérito: ‘seria’ aparece 14 vezes; ‘tentar/tentariam’ merecem 16 aparições”.
Ou seja, o piso do decreto de Moro é o texto das vaguidões, das inexistências e dos pretendidos ilusionismos.
Anterior por poucos dias, o outro caso gritante na última semana fez Hélio Schwartsman considerar cabível a hipótese de que, suscitada em momento de ataque mais agudo a Lula, a história de Fernando Henrique com Mirian Dutraemergisse como um chamariz das atenções. Em tal limite, e sem ameaçar suas veracidades, a hipótese é admissível. E, por força, desdobra-se em outra.
Ainda que Sergio Moro, os procuradores e a PF dispusessem de elementos convincentes para a prisão de Santana e Mônica, seria preciso fazê-la com a urgência aplicada? Nenhum fato a justificou. O risco de fuga era zero, já estando ambos no exterior. Mas o problemático assunto das remessas e contas externas de Fernando Henrique foi sufocado com mais facilidade. Não que se pudesse esperar um tal assunto levado a sério: a Procuradoria Geral da República, os procuradores e a Polícia Federal não foram capazes de emitir, dirigida à população como devido, sequer uma palavra a respeito. Mas sempre poderia ocorrer algum desdobramento a exigir mais para sufocá-lo.
Além disso, a oportunidade foi perfeita para o fato consumado de ampliar o alcance de Sergio Moro e da Lava Jato, apesar da duvidosa legalidade do novo alcance. O âmbito legal das ações de Moro e da Lava Jato não inclui eleição, campanhas, Santana, e atividades das empreiteiras fora do sistema Petrobras. Extendê-lo já foi tentado, mas o Supremo Tribunal Federal barrou-o. Mas é por aqui que se pode entender o serviço prestado por tanto “possível” e “possivelmente” e “seria”: misturam o marqueteiro com dinheiro da Petrobras. E com as campanhas de Lula e de Dilma, que assim são postas na jurisdição das ações da Lava Jato e de seu poderoso juiz.
Sergio Moro, os procuradores e policiais federais falaram muito sem dizer o essencial. Mas já se entende parte dele.
FANTASMAS
Não tenho apreço por João Santana. Sua demissão da campanha eleitoral na República Dominicana me parece positiva para os dominicanos. Com isso, porém, a funcionária fantasma de José Serra pode voltar, também, a Brasília. Para ganhar outra vez, que tristeza, só como fantasma do Senado. Um efeito secundário da ação de Sergio Moro.
Com um ano e sete meses de Lava Jato, as diferenças entre delação premiada e investigações mostram-se ainda. Ou se mostram ainda mais, quando tudo passa dos depoimentos em inquéritos para os julgamentos, que devem pesar as bases para condenar ou absolver. Presume-se que, à falta de investigações, a decisão de um juiz, na discórdia entre ilações de aparência lógica e explicações de aparência lógica, só disponha da opção subjetiva para apresentar como decisão. Um nível de insegurança muito alto, portanto.
No caso de Marcelo Odebrecht, seus registros eletrônicos são apenas parte na acusação. Há também delações premiadas que mencionam sua empresa nas transações corruptas em torno da Petrobras. Mas por Paulo Roberto Costa, e não só por ele, evidenciam-se problemas em delações que deveriam ser evitados por investigações da Polícia Federal e de procuradores. No que se refere a tais evidências, está claro que não houve investigações ou foram insuficientes, fosse na profundidade, fosse na qualidade técnica.
Há esclarecimentos devidos ao país tão abalado pelo que a Lava Jato irradiou. O risco de condenações e absolvições baseado em subjetividades, e por desejo de julgadores ou por pressões, pode ser muita coisa, menos Justiça.
Presidente da Telerj Cunha pagou propina a tucanos
Paulo Baraky
por Janio de Freitas
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A situação pessoal embaraçosa, com o presumido risco de perder milhões de dólares resguardados no exterior para não os perder, deve ter mexido com a frieza de Eduardo Cunha. Mas Eduardo Cunha exagera, supondo-se “execrado”. Muito ao contrário. Eduardo Cunha não está sozinho, não foi abandonado por causa de acusações. E tanto conta com fraternidades espontâneas, como dispõe de armas para produzir interessados em não o incomodar. Ou só fazê-lo em último desespero de causa.
A verdadeira atitude do PSDB, até ontem (10), de benevolência quando as provas contra Eduardo Cunha já levam a pedidos de sua cassação, provém de duas vertentes. Os taradinhos do impeachment preservam o presidente da Câmara porque esperam dele que instale a ação para a derrubada de Dilma e não têm pudor de dizê-lo. Aécio Neves não foi sugerir a Eduardo Cunha que se licenciasse coisa nenhuma, se nem disfarçou o desejo de que seja poupado para encaminhar o processo. O “aquilo” em que esses taradinhos só pensam não é aquilo, é o impeachment.
A outra vertente de proteção peessedebista a Eduardo Cunha veio dos mais velhos que ainda influem no partido. São remanescentes do governo Fernando Henrique. Ou seja, do escândalo das privatizações causado por grampos telefônicos que levaram à saída forçada de ministros e de outros do governo, comprometidos com fraudulências surpreendidas pelas gravações.
Confrontado de repente com uma pergunta sobre a origem das fitas, o general Alberto Cardoso, da Casa Militar, disse que foram encontradas sob um viaduto em Brasília. A verdade era outra. A maior parte dos procedimentos para as privatizações transcorreu no Rio, sede das empresas e do BNDES, além das extensões de ministérios também envolvidos, como Indústria e Fazenda. Tudo se passava, portanto, nos domínios territoriais e operacionais de Eduardo Cunha, presidente da Telerj, a telefônica estatal do Rio, no governo Collor e até a posse de Itamar Franco.
Logo, nada de extraordinário que, pelas investigações ou por dedução, o circuito fechado do governo Fernando Henrique desse as gravações como obra de Eduardo Cunha, que em anos recentes já fora dado como responsável por grampos em série. No seu “diário” de presidente, Fernando Henrique refere-se a Eduardo Cunha deste modo, transcrito da revista “piauí” pela Folha: “O Eduardo Cunha foi presidente da Telerj, nós o tiramos de lá no tempo do Itamar porque ele tinha trapalhadas, ele veio da época do Collor”. Esse “nós” é invenção da vaidade. Fernando Henrique estava indo para Relações Exteriores e nada teve com a exoneração rápida de Eduardo Cunha, decidida e feita por Itamar. Sem sequer considerar trapalhadas, mas, como muitas outras demissões, por ser ligado a PC Farias.
Gravações clandestinas não começam no exato momento comprometedor da conversa. Quem as instalou pode fazer coleções de conversas, personagens e assuntos. E quem sabe que gravações podem trazer-lhe complicações, diretas ou indiretas, não ousa contra o possível colecionador. A não ser quando o veja batido, esvaído, inerte. Como muitos têm esperado ver Eduardo Cunha, para lembrar-se de que são grandes defensores da moralidade. Privada e pública.
Mas não só de grampeamentos se fazem coleções biográficas. Como ex-presidente da Telerj, Eduardo Cunha sabe –e ninguém duvide de que também comprove– que a estatal dava dinheiro a políticos. Quantias fixas. Mês a mês. Por nada.
E Eduardo Cunha não só investigou. Também pagou. Se vai cobrar, ainda não se sabe.
As posições contrárias do Supremo e da Lava Jato quanto à jurisdição apropriada para os processos não ligados aos desvios na Petrobras azedou com inconveniência para os dois lados.
Desagradados com a decisão do Supremo de encaminhar para outro juízo um inquérito que não inclui Petrobras, mas está na Lava Jato, o juiz Sergio Moro e procuradores fazem afirmações agudas. É da regra judicial brasileira, porém, que os inquéritos e processos corram onde teria havido o fato em questão, deslocando-se os julgamentos em casos de extrema excepcionalidade. O Supremo transferiu, de Curitiba para o judiciário federal em São Paulo, o processo sobre pagamentos da empresa Consist que a Lava Jato supõe retribuírem um contrato de gerenciamento do crédito consignado.
Os comentários mais simbólicos da argumentação e da carga forte da Lava Jato contra o decidido pelo Supremo foram postos por Moro em sua sentença condenatória de João Vaccari Neto, ex-tesoureiro do PT. Escreveu ele que a “dispersão das ações penais não serve à causa da Justiça, tendo por propósito pulverizar o conjunto probatório e dificultar o julgamento”.
Sendo quem são, no caso, os imaginados portadores de tal propósito, não há como ver sensatez na afirmação do juiz Sergio Moro, descreditada ainda por valer-se do que deveria ser só uma sentença.
Mas, já que se trata da distribuição de inquéritos, pode-se dispor de um outro trecho de texto. É do balanço feito pelo Ministério Público Federal sobre a ação da sua força-tarefa que se ocupou do grande caso Banestado, aquele das contas CC5. Diz que os inquéritos “se desdobraram em cerca de 3.600 procedimentos criminais, que foram distribuídos para as subseções judiciárias do domicílio dos representados, permanecendo cerca de 600 procedimentos criminais na capital paranaense”.
Foi distribuição como a atacada na sentença, e em outras situações, por Sergio Moro, e em diversas ocasiões por procuradores da Lava Jato. Mas os procuradores da Lava Jato estavam na força-tarefa do Banestado. Tanto que o autor do balanço foi Januário Paludo, procurador nas duas forças-tarefas. E quem procedeu à distribuição dos inquéritos para as jurisdições “do domicílio dos representados”, em qualquer parte do Brasil, foi o juiz Sergio Moro.
Vem um sujeito qualquer e diz um palpite infeliz, e a imprensa sectária faz que leva a sério. Transforma em manchete a presunção, a hipótese, a conjectura, a desconfiança, a apreensão, a presunção, suposição, a cisma de um policial faccioso, partidário, vingativo.
JANIO: CAÇADA A LULA COLOCA PF SOB SUSPEITA
“Se a Polícia Federal não apresentar indícios e argumentos, o alto número de convictos de haver caça a Lula vai aumentar muito”, afirma o jornalista, a respeito do pedido de um delegado da PF ao STF para ouvir Lula no âmbito da Lava Jato, mesmo sem ter provas contra o ex-presidente; segundo ele, “a PF levou tão longe o propósito de enquadrar Lula que acabou na situação original de ficar ela mesma sujeita às suas suspeitas”
Vitória
247 – “A PF levou tão longe o propósito de enquadrar Lula que acabou na situação original de ficar ela mesma sujeita às suas suspeitas”, afirma o jornalista Janio de Freitas, em sua coluna deste domingo.
Segundo ele, “se a Polícia Federal não apresentar indícios e argumentos, o alto número de convictos de haver caça a Lula vai aumentar muito”.
O colunista comenta o pedido feito pelo delegado da Polícia Federal Josélio de Sousa ao Supremo Tribunal Federal para ouvir Lula no âmbito da Lava Jato, mesmo sem ter provas diretas contra o ex-presidente, conforme ele próprio admite no documento.
Trecho do documento da PF “recusa a possibilidade de inexistirem, no governo, pessoas insuspeitas de conexão com negócios ilícitos na Petrobras.” Janio comenta: “Se a ‘base de apoio’ para isso era ‘sustentada à custa de negócios ilícitos na referida estatal’, com ‘vantagens mesmo para o governo’, a PF, como parte do governo, fica incluída na suspeita que lança.”
Pó pará, Aécio! A mais longa síndrome de abstinência da história
por Gilmar Crestani
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As operações da Polícia Federal, de que fala a ADPF, combinada com a perda das chaves do Aeroporto de Cláudio, deixaram Aécio Neves exasperado. A síndrome de abstinência persiste tanto mais porque apanhou nos dois Estados que ele tinha como se fossem sua própria casa: Minas e Rio.
É por comportamentos como este que o partido que tinha por projeto ficar 20 anos no poder, como verbalizou o PC Farias do PSDB, Sérgio Motta, que FHC e seus sequelados estão alijados do Poder Central. Pior, é o retorno de Lula em 2018 que os enlouquece. Uma compra de reeleição do país tolera, será que terá estômago para digerir este tapetão de obsessão infantil de maus perdedores.
Se ele pode me chamar, como eleitor de Dilma, membro de “organização criminosa”, por que eu não poderia chama-lo de toxicômano?!
A violência do Aécio não é tresloucada
por Paulo Henrique Amorim
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Perdeu em casa, onde vive, onde fez romaria fúnebre
A loucura de Hamlet tinha uma lógica.
A violência pós-fascista de Aécio Never também.
Aécio perdeu em casa: Minas.
Perdeu onde vive: Rio.
Perdeu onde fez romaria fúnebre: Pernambuco.
A luta de Aécio é por sobrevivência.
Dentro do PSDB.
Ele perdeu a base de Minas.
E não tem a de São Paulo.
Ou ele acha que o Beto Richa, o Perillo e o Sartori apoiam ele?
Nem o Aloysio 300 mil, o vice que é mais cerrista que o genro do Cerra.
Aécio vai percorrer o caminho da extrema-direita, como tentou o Cerra em 2010.
Na sórdida campanha do aborto e da bolinha de papel.
Com o apoio de D Odilo e toda a Igreja !
Inclusive do Papa Bento.
Aécio vai tentar a mesma estrada de Damasco.
Cair no colo da extrema-direita para enfrentar os tucanos de São Paulo em seu território.
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Se ele acha que está sendo ‘porta-voz da indignação’, fica evidente que não sabe mesmo o que está fazendo
Ela se apropriou da política econômica defendida por Aécio, mas Aécio não se deixa abater e já demonstra que pode fazer o mesmo: adere à redução da desigualdade social por meio da distribuição de renda, defendida por Dilma na campanha.
A reviravolta de Dilma foi mais surpreendente, mas a de Aécio é mais original no método. Veio pela TV, na amenidade noturna do fim de semana, e naquele estilo de elegância chamado “curto e grosso”.
Nas próprias palavras do ainda pretendente à Presidência da República: “Na verdade, eu não perdi a eleição para um partido político, eu perdi a eleição para uma organização criminosa que se instalou no seio de algumas empresas brasileiras patrocinada por esse grupo político que aí está”.
De fato, Aécio não perdeu para um partido político. Perdeu para os eleitores, petistas, peemedebistas e nada disso, que lhe negaram o voto e o deram a Dilma. Qualquer deles agora habilitado, desde que capaz de alguma prova de sua adesão a Dilma, a mover uma ação criminal contra Aécio Neves por difamação, calúnia e injúria, e cobrar-lhe uma indenização por danos morais.
Uma foto em manifestação, uma doação ou um serviço para a campanha, um cartaz ou um retrato na janela, uma propaganda no carro, em qualquer lugar do país podem se juntar às demais provas para dar uma resposta à acusação de Aécio Neves tão gratuitamente agressiva e tão agressivamente insultuosa.
É difícil admitir que Aécio Neves esteja consciente do papel que está exercendo. A situação social do Brasil não é de permitir que acirramentos, incitações e disseminação de ódios levem apenas a efeitos inócuos, de mera propaganda política. Para percebê-lo, não é preciso mais do que notar a violência dos protestos com incêndios ou a quantidade de armas apreendidas.
Se Aécio acha, como diz, que está sendo “porta-voz de um sentimento de indignação”, pior ainda: fica evidente que não sabe mesmo o que está fazendo, e aonde isso o leva.
Ricardo da Costa: Detalhe de uma pintura mural do Egito antigo, tumba (Tebas) de Userhat (reinado de Amen-hotep II, XVIII dinastia, c. 1428 e 1397 a. C). São quatro mulheres de luto, vestidas de branco, sentadas, duas segurando a cabeça com as mãos e chorando compulsivamente. Elas também estão pegando pó para jogá-lo sobre suas cabeças, ato muito comum e recorrente nas sociedades pré-industriais. Todo esse pranto, toda essa dor pela perda do esposo não nos deve impressionar, insensíveis que nos tornamos. Nas sociedades pré-industriais, as pessoas sentiam as coisas muito mais intensamente do que nós hoje. Embrutecemos. O historiador Johan Huizinga (1872-1945), há quase cem anos, em sua famosa obra O Outono da Idade Média (1919) já alertara para a notável sensibilidade à flor da pele das culturas antigas, dos medievais: tudo era muito mais sentido, sofrido e regozijado.
Segundo o colunista Janio de Freitas, ao demorar para anunciar seu apoio a Aécio Neves (PSDB), Marina Silva “instalou a implosão em dois partidos”: “proporcionou tempo para que uma ala do PSB, com o estandarte da viúva de Eduardo Campos, articulasse o abandono da linha tradicional do partido, de centro-esquerda”, e um racha de parte da Rede, que considerou a adesão “grave erro” e contrária ao projeto original
247 – O colunista Janio de Freitas atribui a Marina Silva o apelido de “divisora”. Segundo ele, ao ‘espichar as atenções por mais uns dias sobre sua posição no 2° turno, ela instalou a implosão em dois partidos’.
No PSB, diz que ela proporcionou tempo para que uma ala, com o estandarte da viúva de Eduardo Campos, articulasse o abandono da linha tradicional do partido, de centro-esquerda, e a necessária derrubada dos dirigentes mais identificados com sua formação.
Quanto a Rede, lembra que parte da sigla considerou adesão a Aécio, decidida por Marina, “grave erro” e contrária ao “projeto original”, ao torná-la “parte da polarização PT x PSDB”.
Marina Divisora
Jarbas
por Janio de Freitas
A adesão de Marina Silva a Aécio Neves é o seu caminho convencional, mas, para formular os argumentos vazios que invocou, não precisava de tantos dias, bastavam minutos. Além disso, Marina já tem convivência bastante com a política para saber que nenhuma condição exigida de Aécio tem valor algum: se eleito e por ela cobrado, não esqueceria o velho refrão político “as circunstâncias mudaram”. Ao espichar as atenções por mais uns dias, no entanto, Marina instalou a implosão em dois partidos. Um feito, sem dúvida.
A demora de Marina proporcionou tempo para que uma ala do Partido Socialista Brasileiro, com o estandarte da viúva de Eduardo Campos, articulasse o abandono da linha tradicional do partido, de centro-esquerda, e a necessária derrubada dos dirigentes mais identificados com o PSB. Novo rumo: adesão a Aécio.
Em termos partidários, é como se o PSB fosse extinto, com uma descaracterização que preserva apenas o nome e a sigla. Não de todo, aliás, com o humor já se referindo ao “novo PV”: não de Partido Verde, mas Partido da Viúva.
O manifesto “A favor da nova política” tem argumentos consideráveis e reúne, em corrente própria, os que se integraram à Rede Sustentabilidade, partido de Marina, para construir novos modos de fazer política. E consideram a adesão a Aécio, decidida por Marina, “grave erro” e contrária ao “projeto original da Rede Sustentabilidade”, ao torná-la “parte da polarização PT x PSDB”. A adesão agrava-se porque Aécio, diz o manifesto, tem “integração orgânica à desconstituição de direitos, aos ruralistas e ao capital financeiro”, três frentes a que a Rede se opõe por princípio.
Para contornar a reação de correligionários valiosos, Marina Silva precisará de argumentos melhores do que lhe bastaram para aderir ao candidato do PSDB, em vez de “rejeitar as duas candidaturas”. Rede se remenda. O PSB, não.
Apoio a Aécio provoca debandada na cúpula da Rede
Casso
Jornal GGN – Sete coordenadores do Rede Sustentabilidade em São Paulo saíram do partido em protesto à adesão de Marina Silva à candidatura de Aécio Neves. São eles os coordenadores executivos Valfredo Pires e Marcelo Pilon; os coordenadores de comunicação Emílio Franco e Renato Ribeiro; os coordenadores de finanças Gérson Moura e Marcelo Saes e o coordenador de organização Washington Carvalho.
Na parte mais dura do manifesto, o grupos salienta que “As nossas esperanças de um Brasil mais justo, mais ético e mais sustentável mostraram-se como mercadorias, à venda por promessas que não surtirão resultados a médio e a longo prazo”.
Folha de S. Paulo (por Gustavo Uribe) – Em carta, sete coordenadores do partido pediram renúncia de suas atribuições
No texto, o grupo afirma que o apoio a qualquer um dos candidatos à sucessão presidencial neste segundo turno reforça a polarização entre PT e PSDB, criticada pela Rede no primeiro turno da disputa eleitoral.
Em uma crítica ao PSDB, o grupo afirma que não pode servir indiretamente a um projeto de poder que “já foi testado” e com o qual não concorda. Ele ressalta ainda que não responderá pelo “assassinato” de ideais e princípios que o atraíram à Rede.
“No primeiro turno, a Rede tinha como discurso sair da polarização entre PSDB e PT. E, agora, quebra-se essa posição”, criticou Pires.
“Traição à luta”
Jrobson
O presidente nacional do PSB, Roberto Amaral, divulgou neste sábado (11) uma carta aberta em que apoia a reeleição de Dilma Rousseff (PT) e afirma que seu partido “traiu a luta” do ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos ao se aliar a Aécio Neves (PSDB).
Amaral diz na carta que ao se aliar “acriticamente” à candidatura Aécio Neves, o bloco que controla o partido “renega compromissos programáticos e estatutários” e “joga no lixo o legado de seus fundadores”.
“Ao aliar-se à candidatura Aécio Neves, o PSB traiu a luta de Eduardo Campos, encampada após sua morte por Marina Silva, no sentido de enriquecer o debate programático pondo em xeque a nociva e artificial polarização entre PT e PSDB.”
Por vingança, dentro do PSB, um grupo de dirigentes em Pernambuco pretende tirar Roberto Amaral da presidência da sigla. O mais cotado para o cargo seria o gaúcho Beto Albuquerque, líder da bancada ruralista na Câmara dos Deputados,e lobista das empresas de fumo, armas e transgênicos, que concorreu como vice de Marina, que se declarou herdeira da Campos e viúva.
Leia abaixo a íntegra da carta aberta:
“Mensagem aos militantes do PSB e ao povo brasileiro
A luta interna no PSB, latente há algum tempo e agora aberta, tem como cerne a definição do país que queremos e, por consequência, do Partido que queremos. A querela em torno da nova Executiva e o método patriarcal de escolha de seu próximo presidente são pretextos para sombrear as questões essenciais. Tampouco estão em jogo nossas críticas, seja ao governo Dilma, seja ao PT, seja à atrasada dicotomia PT-PSDB – denunciada, na campanha, por Eduardo e Marina como do puro e exclusivo interesse das forças que de fato dominam o país e decidem o poder.
Ao aliar-se acriticamente à candidatura Aécio Neves, o bloco que hoje controla o partido, porém, renega compromissos programáticos e estatutários, suspende o debate sobre o futuro do Brasil, joga no lixo o legado de seus fundadores – entre os quais me incluo – e menospreza o árduo esforço de construção de uma resistência de esquerda, socialista e democrática.
Esse caminhar tortuoso contradiz a oposição que o Partido sustentou ao longo do período de políticas neoliberais e desconhece sua própria contribuição nos últimos anos, quando, sob os governos Lula dirigiu de forma renovadora a política de ciência e tecnologia do Brasil e, na administração Dilma Rousseff, ocupou o Ministério da Integração Nacional.
Ao aliar-se à candidatura Aécio Neves, o PSB traiu a luta de Eduardo Campos, encampada após sua morte por Marina Silva, no sentido de enriquecer o debate programático pondo em xeque a nociva e artificial polarização entre PT e PSDB. A sociedade brasileira, ampla e multifacetada, não cabe nestas duas agremiações. Por isso mesmo e, coerentemente, votei, na companhia honrosa de Luiza Erundina, Lídice da Mata, Antonio Carlos Valadares, Glauber Braga, Joilson Cardoso, Kátia Born e Bruno da Mata, a favor da liberação dos militantes.
Como honrar o legado do PSB optando pelo polo mais atrasado? Em momento crucial para o futuro do país, o debate interno do PSB restringiu-se à disputa rastaquera dos que buscam sinecuras e recompensas nos desvãos do Estado. Nas ante-salas de nossa sede em Brasília já se escolhem os ministros que o PSB ocuparia num eventual governo tucano. A tragédia do PT e de outros partidos a caminho da descaracterização ideológica não serviu de lição: nenhuma agremiação política pode prescindir da primazia do debate programático sério e aprofundado. Quem não aprende com a História condena-se a errar seguidamente.
Estamos em face de uma das fontes da crise brasileira: a visão pobre, míope, curta, dos processos históricos, visão na qual o acessório toma a vez do principal, o episódico substitui o estrutural, as miragens tomam o lugar da realidade. Diante da floresta, o medíocre contempla uma ou outra árvore. Perde a noção do rumo histórico.
Ao menosprezar seu próprio trajeto, ao ignorar as lições de seus fundadores – entre eles João Mangabeira, Antônio Houaiss, Jamil Haddad e Miguel Arraes –, o PSB renunciou à posição que lhe cabia na construção do socialismo do século XXI, o socialismo democrático, optando pela covarde rendição ao statu quo. Renunciou à luta pelas reformas que podem conduzir a sociedade a um patamar condizente com suas legítimas aspirações.
Qual o papel de um partido socialista no Brasil de hoje? Não será o de promover a conciliação com o capital em detrimento do trabalho; não será o de aceitar a pobreza e a exploração do homem pelo homem como fenômeno natural e irrecorrível; não será o de desaparelhar o Estado em favor do grande capital, nem renunciar à soberania e subordinar-se ao capital financeiro que construiu a crise de 2008 e construirá tantas outras quantas sejam necessárias à expansão do seu domínio, movendo mesmo guerras odientas para atender aos insaciáveis interesses monopolísticos.
O papel de um partido socialista no Brasil de hoje é o de impulsionar a redistribuição da riqueza, alargando as políticas sociais e promovendo a reforma agrária em larga escala; é o de proteger o patrimônio natural e cultural; é o de combater todas as formas de atentado à dignidade humana; é o de extinguir as desigualdades espaciais do desenvolvimento; é o de alargar as chances para uma juventude prenhe de aspirações; é o de garantir a segurança do cidadão, em particular aquele em situação de risco; é o de assegurar, através de tecnologias avançadas, a defesa militar contra a ganância estrangeira; é o de promover a aproximação com nossos vizinhos latino-americanos e africanos; é o de prover as possibilidades de escolher soberanamente suas parcerias internacionais. É o de aprofundar a democracia.
Como presidente do PSB, procurei manter-me equidistante das disputas, embora minha opção fosse publicamente conhecida. Assumi a Presidência do Partido no grave momento que se sucedeu à tragédia que nos levou Eduardo Campos; conduzi o Partido durante a honrada campanha de Marina Silva. Anunciados os números do primeiro turno, ouvi, como magistrado, todas as correntes e dirigi até o final a reunião da Comissão Executiva que escolheu o suicídio político-ideológico.
Recebi com bons modos a visita do candidato escolhido pela nova maioria. Cumprido o papel a que as circunstâncias me constrangeram, sinto-me livre para lutar pelo Brasil com o qual os brasileiros sonhamos, convencido de que o apoio à reeleição da presidente Dilma Rousseff é, neste momento, a única alternativa para a esquerda socialista e democrática. Sem declinar das nossas diferenças, que nos colocaram em campanhas distintas no primeiro turno, o apoio a Dilma representa mais avanços e menos retrocessos, ou seja, é, nas atuais circunstâncias, a que mais contribui na direção do resgate de dívidas históricas com seu próprio povo, como também de sua inserção tão autônoma quanto possível no cenário global.
Denunciamos a estreiteza do maniqueísmo PT-PSBD, oferecemos nossa alternativa e fomos derrotados: prevaleceu a dicotomia, e diante dela cumpre optar. E a opção é clara para quem se mantém fiel aos princípios e à trajetória do PSB.
O Brasil não pode retroagir.
Convido todos, dentro e fora do PSB, a atuar comigo em defesa da sociedade brasileira, para integrar esse histórico movimento em defesa de um país desenvolvido, democrático e soberano.
“Acredito que estou agindo de acordo com o Criador Todo-Poderoso” Hitler
A maior desonestidade de Marina é a certeza de crer que age em nome da Providência Divina. E que foi salva por Deus para presidir o Brasil.
E que ela e parceiros de campanha eleitoral estão sendo satanizados pelos adversários políticos.
Santa Marina. Santo o marido dela!
Marina não agride, não critica. Unicamente exorciza, em nome de Jesus. (*)
Thiago Lucas
Escreve Janio de Freitas: Não se imaginava que a Marina Silva tão contida, como se toda travada por poderosas forças interiores, ou, sabe-se lá, celestiais (“Deus não quis que eu estivesse naquele avião”), fosse capaz de tamanha desinibição para dizer coisas como esta raridade: “Um partido que coloca por 12 anos um diretor para assaltar os cofres da Petrobras”. “Para assaltar”? A desonestidade dessa afirmação, feita em sabatina há três dias no “Globo”, não tem limite nem para trás.
Funcionário de carreira, Paulo Roberto Costa fez sua ascensão na Petrobras durante o governo Fernando Henrique, nomeado então para sucessivos postos e funções relevantes, que vieram a culminar no governo Lula. É um mistério o momento em que começou sua corrupção. Mas há a certeza de que, a não ser para Marina, nenhum partido e nenhum governo dos dois presidentes promoveu Paulo Roberto Costa “para assaltar”.
Diante de tamanha e perversa difamação, não surpreende a facilidade com que Marina diz inverdades bondosas a seu respeito, atribuindo-se votos, pareceres e projetos no Senado que o Senado nunca ouviu ou leu. Sua agressividade tem este componente adicional: a inverdade. O que aquela sabatina tornou ainda mais perceptível (e registrado jornalisticamente).
Mas de Dilma, a “durona”, a “gerentona”, esperava-se que ao menos confirmasse a maneira como a imprensa a descreve. A surpresa que lhe cabe vem, no entanto, do oposto: é a menos ofensiva, tanto no sentido de ataque como de insulto. Tem preferido dar respostas, algumas duras e outras irônicas.(Transcrevi trechos)
— (*) Exorcizar. Utilizar o exorcismo para retirar, afastar, expulsar os demônios ou maus espíritos que se apossaram do corpo de alguém. Figurado: Gritar ou lançar berros com a pessoa que esconjura. (Etm. do grego: eksorkízo, pelo latim: exorcizare). São sinônimos:
Conjurar. Evitar (um mal iminente) por meio de práticas religiosas, cabalísticas ou mágicas; conjurar o demônio.
Exorcismo na sinagoga de Cafarnaum. Afresco do século XI na Abadia de Lambach, na Áustria.
O exorcismo na sinagoga de Cafarnaum é um dos milagres de Jesus, relatado em Marcos 1:21-28 e Lucas 4:31-371 .
De acordo com os evangelhos, no sabbath, Jesus e seus discípulos foram para Cafarnaum e Jesus começou a pregar. As pessoas ficaram maravilhadas com seus ensinamentos, pois ele os passava com autoridade e não da forma dos doutores da Lei. Neste momento, um homem que estava na sinagoga e que estava possuído por um espírito maligno gritou “Que temos nós contigo, Jesus Nazareno? Vieste a perder-nos. Bem sei quem és, és o Santo de Deus! Jesus repreendeu-o, dizendo: Cala-te e sai desse homem. O espírito imundo, agitando-o violentamente e bradando em alta voz, saiu dele.” (conforme o Evangelho de Marcos).
As pessoas ficaram novamente espantadas e perguntaram umas às outras: “Que é isto? uma nova doutrina com autoridade! ele manda aos próprios espíritos imundos, e eles lhe obedecem!”. Notícias sobre Jesus então se espalharam por toda a região.
Jornalista Jânio de Freitas rebate a defesa do presidente do STF, Joaquim Barbosa, no caso do pedido de quebra de sigilo telefônico da área dos prédios dos Três Poderes para investigação do suposto uso de celular pelo ex-ministro José Dirceu; Jânio comenta resposta enviada pelo STF ao artigo que produziu na semana passada, em que levanta questões sobre a atuação de Barbosa no caso.
O jornalista Jânio de Freitas rebate, em artigo publicado neste domingo (20) na Folha, a defesa do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, no caso do pedido de quebra de sigilo telefônico da área que envolve o Palácio do Planalto, do Senado, da Câmara e do próprio STF para investigação do suposto uso de celular pelo ex-ministro José Dirceu, encarcerado no Presídio da Papuda desde novembro passado.
Jânio comenta resposta enviada pela assessoria do presidente do STF ao artigo que produziu na semana passada, em que levanta questionamentos sobre a atuação de Barbosa no caso. E rebate cada ponto da defesa do ministro. Confira abaixo:
Passos fora do Painel
O Painel do Leitor, localização nobre que a Folha destina às contestações, críticas e outras considerações sobre o que publicou, não foi visto pelo secretário de comunicação do Supremo Tribunal Federal, Wellington Geraldo Silva, como apropriado a uma nota sua para desejada defesa do ministro Joaquim Barbosa. Em exaltada cobrança telefônica há uma semana, no domingo passado, indagou “que espaço temos para responder?”. Por mim, todo o de que eu possa dispor, sem com isto diminuir meu apreço pelo sentido democrático do Painel do Leitor.
A nota é a propósito do artigo “Nos passos de Obama”, do domingo, 13.abr.14, sobre o uso ardiloso de coordenadas geográficas pela promotora Márcia Milhomens Sirotheau Corrêa para pedir quebra de sigilos telefônicos que, a pretexto de verificar alegado telefonema de José Dirceu na Papuda, violaria também as comunicações de todos os celulares do Planalto. Soube-se, no decorrer da semana, que também os sigilos de celulares do Senado, da Câmara e do próprio Supremo Tribunal Federal cairiam, na violação pretendida.
Passados cinco dias do artigo, na sexta, 18, diz a nota: “Na coluna de 13.4.2014, que trata de pedido formulado ao Supremo Tribunal Federal pelo Ministério Público do DF à Vara de Execuções Penais de Brasília, o ministro Joaquim Barbosa é acusado de participação em um ato criminoso, qual seja a quebra ilegal de sigilo telefônico. Sem que o ministro tenha sido ouvido, são feitas afirmações sobre a conduta dele, tais como: É interessante que o juiz da Vara de Execuções Penais e o ministro Joaquim Barbosa não dessem sinal algum de estranheza…’ (…) A alternativa a essa indiferença seria o conhecimento prévio, por ambos, da artimanha…’. São acusações graves, desprovidas, porém, de amparo na realidade dos fatos”.
Segue: “Uma simples consulta ao andamento do processo –que é público, diga-se– permitiria ao senhor e a qualquer pessoa interessada verificar todos os procedimentos adotados pelo presidente do STF. Nessa consulta, seria possível concluir que a primeira providência adotada foi o envio do pedido para manifestação da Procuradoria-Geral da República. Só após esse parecer é que o ministro estará habilitado a analisar todos os aspectos envolvidos no pedido, e então tomar uma decisão. Isso é o que manda a lei. Todos esses procedimentos também teriam sido informados caso o presidente do STF tivesse a oportunidade de ser ouvido antes da publicação da sua coluna. O fato é que ainda não houve nenhuma manifestação do ministro Joaquim Barbosa sobre o pedido formulado pelo Ministério Público do Distrito Federal”.
Por fim: “Esclarecemos ainda que o Supremo Tribunal Federal atua dentro dos parâmetros da Constituição Brasileira [sic] na AP 470 e em todas as [sic] milhares de Ações que julga. Portanto, refutamos qualquer insinuação sobre a legalidade dos procedimentos adotados pelo tribunal”.
Transcrevo o parágrafo de onde a nota pinçou dois pedaços de frases, e deu-lhes reticências sugestivas, mas inexistentes no artigo:
“É também interessante que o juiz da Vara de Execuções Penais e o ministro Joaquim Barbosa não dessem sinal algum de estranheza –sem falarmos nas providências legais necessárias– ao deparar-se com coordenadas geográficas de latitude e longitude para pedir quebra de sigilo telefônico de números, endereços e portadores de celulares não citados. A alternativa a essa indiferença seria o conhecimento prévio, por ambos, da artimanha e do alcance da alegada identificação de telefonema no presídio da Papuda.”
O juiz e o ministro deram algum “sinal de estranheza” ante o ofício com anormal uso de coordenadas, em vez de números telefônicos e nomes, sem qualquer explicação para isso? Não. Logo, a frase não contém acusação, referindo-se a um fato real e não negado. Fato que a mim, e a outros de semelhante reação, nada proíbe de achar interessante.
A outra “acusação grave”. O artigo diz que a alternativa SERIA, condicional, não diz que foi, nem o insinua. Para quem a lê sem presunção, o que a frase diz é que o juiz e o ministro só não estariam faltando com a atenção merecida pelo ato anormal do ofício, e razão bastante de estranheza, em caso de terem conhecimento prévio da artimanha. Não os acusa de o terem.
O acusado passo a ser eu. A nota me acusa, em referência a Joaquim Barbosa, de o haver “acusado de participação em um ato criminoso”. A nota faz uma afirmação inverdadeira. E reiterada.
Quanto à afirmação de que ao ministro cabe receber e mandar ofício ao procurador-geral da República, para só depois opinar, é esquecer duas obviedades. Primeira: o ministro tem a autoridade e o dever de examinar cada ofício recebido e lhe dar o encaminhamento adequado, sendo um deles a rejeição por impropriedade. Segunda: o oposto disso é reduzir ministro do Supremo a tarefas de estafeta, entregador de papéis de um lado para outro, como sugere a nota.
Aproveito a ocasião para um acréscimo nesse caso das coordenadas. O pedido de quebra dos sigilos foi encaminhado ao presidente do Supremo em 28 de março, quando o juiz que o encaminhou já se dissera impedido de atuar no processo, por “motivos de foro íntimo”, e sua transferência já estava determinada pelo Tribunal de Justiça.
Cristina Moreno de Castro: Dou uma pausa na enxurrada de posts sobre filmes, nesses tempos de Oscar, para publicar um excelente artigo do meu pai, que andava sumido do blog, sobre uma frase proferida na última quarta-feira por Joaquim Barbosa, presidente do Supremo Tribunal Federal, que tinha passado batido por mim. Mas é uma frase para entrar na história. Vamos ao artigo:
Texto escrito por José de Souza Castro:
O julgamento foi um espetáculo, uma farsa, uma maneira ridícula de procurar a verdade. Mas, como pude perceber, a verdade não era importante. Talvez em outros tempos um julgamento fosse um exercício de apresentação dos fatos, a busca pela verdade e a descoberta da justiça. Hoje um julgamento é um concurso em que um lado vencerá e o outro perderá. Cada lado espera que o outro se curve às regras ou trapaceie, então nenhum lado faz um jogo justo. A verdade se perde na disputa.
Não, não estou escrevendo sobre a Ação Penal 470, o chamado julgamento do mensalão petista. Nem fui eu quem escreveu o relato acima. Trata-se simplesmente de um parágrafo de “O manipulador”, o último livro de John Grisham, publicado em 2012 nos Estados Unidos e, no ano seguinte, no Brasil, pela Rocco, traduzido por Maira Parula. (E que ainda não acabei de ler.)
Nada a ver com a AP 470. Mas me faz pensar nesse processo, tendo em vista o muito que já se escreveu sobre esse julgamento do Supremo Tribunal Federal.
Desde logo vou avisando que sou um cético em relação ao judiciário. Cheguei até a escrever um livro que faz parte da biblioteca deste blog (Injustiçados – o Caso Portilho), antes mesmo de conhecer esse famoso trecho do discurso de Rui Barbosa no Senado sobre o caso do Satélite II: “De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto.”
Ninguém se lembra mais desse caso que provavelmente foi famoso nos tempos de Rui Barbosa, mas o que o jurista baiano escreveu continua inesquecível, porque é muito atual.
A questão que se apresenta é esta: houve injustiça no julgamento da AP 470 ou na aplicação das penas aos condenados, apesar da inquestionável maioria dos que acham, principalmente na imprensa, que a maioria dos juízes do Supremo acertou ao mandar para a prisão José Dirceu, José Genoíno, Delúbio Soares e tantos outros?
No dizer de céticos como Wentworth Dillon, poeta inglês que viveu no século 17, “a multidão está sempre errada”. E já que me lembrei desse inglês, não custa citar Charles Dickens, nascido na mesma Inglaterra dois séculos depois, que dedicou parte de seu talento de crítico social para escrever em 1853 o romance “Bleak House”. A descrição das leis e do judiciário britânico de seu tempo talvez abale a confiança do leitor brasileiro honrado que ainda considera os ingleses que exploraram o ouro das Minas Gerais como paradigmas de civilização. A estes, serve de consolo uma frase de Samuel Johnson, pensador inglês que viveu um século antes de Dickens: “É melhor sofrer injustiça do que fazê-la, e preferível ser às vezes enganado do que não confiar.”
Aos que, como eu, preferem confiar desconfiando, talvez fosse mais prudente seguir o conselho de Siro, que na Roma antiga pensava que o remédio para os males é esquecê-los. Não sei se Siro chegou a conhecer Jesus, que não esqueceu e foi crucificado.
Sem querer nada parecido para os leitores, acho perfeitamente possível esquecer Joaquim Barbosa, o grande protagonista da AP 470, que logo estará deixando a presidência do Supremo e talvez nem seja eleito para outro cargo importante. Mas, como aquela frase de Rui Barbosa (e outras citadas aqui), talvez dure muito mais na memória escrita, depois que todos nós tivermos partido desta vida (para melhor, espero), esta frase dele numa das últimas sessões do julgamento: “Foi feito para isso sim!”.
Não saberia explicar a importância dessa frase com a competência de Janio de Freitas, na “Folha de S. Paulo” deste domingo. Como sei que alguns leitores deste blog não leem o jornal, reproduzo abaixo o artigo intitulado “Uma frase imensa”, sem pedir permissão ao autor e ao editor, na esperança de que nenhum dos dois vá se importar:
“Palavras simples, para uma frase simples. E, no entanto, talvez a mais importante frase dita no Supremo Tribunal Federal nos 29 anos desde a queda da ditadura.
Um ministro considerara importante demonstrar que determinadas penas, aplicadas pelo STF, foram agravadas desproporcionalmente, em até mais 75% do que as aplicadas a crimes de maior gravidade. Valeu-se de percentuais para dar ideia quantitativa dos agravamentos desproporcionais. Diante da reação temperamental de um colega, o ministro suscitou a hipótese de que o abandono da técnica judicial, para agravar mais as penas, visasse um destes dois objetivos: evitar o reconhecimento de que o crime estava prescrito ou impedir que os réus gozassem do direito ao regime semiaberto de prisão, em vez do regime fechado a que foram condenados.
Hipótese de gritante insensatez. Imaginar a mais alta corte do país a fraudar os princípios básicos de aplicação de justiça, com a concordância da maioria de seus integrantes, é admitir a ruína do sistema de Justiça do país. A função do Supremo na democracia é sustentar esse sistema, viga mestra do Estado de Direito.
O ministro mal concluiu a hipótese, porém, quando alguém bradou no Supremo Tribunal Federal: “Foi feito para isso sim!”. Alguém, não. O próprio presidente do Supremo Tribunal Federal e presidente do Conselho Nacional de Justiça. Ninguém no país, tanto pelos cargos como pela intimidade com o caso discutido, em melhor situação para dar autenticidade ao revelado por sua incontinência agressiva.
Não faz diferença se a manipulação do agravamento de pena se deu em tal ou qual processo, contra tais ou quais réus. O sentido do que “foi feito” não mudaria conforme o processo ou os réus. O que “foi feito” não o foi, com toda a certeza, por motivos materiais. Nem por motivos religiosos. Nem por motivos jurídicos, como evidenciado pela inexistência de justificação, teórica ou prática, pelos autores da manipulação, depois de desnudada pelo presidente do Supremo.
Restam, pois, motivos políticos. E nem isso importa para o sentido essencial do que “foi feito”, que é renegar um valor básico do direito brasileiro –a combinação de prioridade aos direitos do réu e segurança do julgamento– e o de fazê-lo com a violação dos requisitos de equilíbrio e coerência delimitados em leis.
Quaisquer que fossem os seus motivos, o que “foi feito” só foi possível pela presença de um fator recente no Supremo Tribunal Federal: a truculência. “O Estado de S. Paulo” reagiu com forte editorial na sexta-feira, mas a tolerância com a truculência tem sido a regra geral, inclusive na maioria do próprio Supremo. A sem-cerimônia com que o presidente excede os seus poderes e interfere, com brutalidade, nas falas de ministros, só se compara à facilidade com que lhes distribui insultos. E, como sempre, a truculência faz adeptos: a adesão do decano da corte, outrora muito zeloso de tal condição, foi agora exibida outra vez com um discurso, a título de voto, tão raivoso e descontrolado que pareceu, até no vocabulário, imitação de Carlos Lacerda nos seus piores momentos.
Nomes? Não fazem hoje e não farão diferença, quando acharmos que teria sido melhor não nos curvarmos tanto à truculência.”