
A carta e os nomes dos assinantes. que deixam claro qual o papel dos professores.
Uma vez mais, vivemos na FFLCH a paralisação de grande parte de nossas atividades
acadêmicas. Embora decorrência de um movimento político legítimo do corpo discente,
não se pode deixar de notar que a imposição forçada da greve ao conjunto da Faculdade
se dá por métodos de coerção inaceitáveis e inapropriados ao convívio universitário.
Também não se pode deixar de alertar para os efeitos deletérios que tal situação impõe
ao processo educacional e à pesquisa.
Diante desse quadro, temos optado automaticamente por uma adesão ilimitada ao
movimento estudantil em nome da solidariedade. Temos abdicado de apontar e condenar
as derivas autoritárias e truculentas de uma parcela nem sempre representativa dos
alunos. Temos, sobretudo, cultivado a irresponsabilidade de comportamento ao sinalizar
que, seja qual for a duração da paralisação, o conjunto dos alunos não será prejudicado.
Essa postura tem promovido um aviltamento da importância das atividades de ensino e
pesquisa que são ciclicamente interrompidas, tem alimentado a escalada de
agressividade e conflito entre os membros da comunidade, tem, por fim, esvaziado o
próprio potencial político das lutas por uma melhor universidade.
Acreditamos que é mais do que hora de mudar vigorosamente de atitude.
Não desconhecemos que as atuais estruturas de poder da USP sejam pouco permeáveis
às aspirações coletivas, mas reconhecemos, igualmente, o esgotamento das soluções
que afetam irrecuperavelmente nosso cotidiano de trabalho e estudo. Manifestamo-nos,
não contra a greve estudantil, e sim contra métodos de ação como “cadeiraços”,
barricadas e piquetes, que impedem o livre acesso às salas de aula e o diálogo entre
professores e estudantes.
É excepcionalmente grave que se tenha tornado tão banal a interrupção forçada de um
trabalho universitário sério e precioso, que nutre nossas esperanças de um futuro mais
digno e socialmente justo. Não podemos mais aceitar passivamente essa insana espiral.
Desde que as barricadas se levantam para impedir aulas, a obstrução física se impõe,
esvaziando toda possibilidade de concerto e tolhendo as liberdades de cada um. Desde
que os piquetes começam, a vontade da minoria militante impera, dificultando ouvir as
vozes dissonantes, mesmo majoritárias, sepultando o diálogo entre os próprios
estudantes e destes com os docentes. Desde que invasões e ocupações são
apresentadas como primeira estratégia, os canais de comunicação com a administração,
já rarefeitos, afunilam-se ainda mais e minguam, abrindo caminho para o pior.
Reafirmamos o nosso respeito ao direito dos alunos de mobilizarem-se em torno das suas
reivindicações. Ao mesmo tempo, condenamos firmemente a ação política que faz uso de
métodos coercitivos e autoritários, afastando mais do que mobilizando a maioria dos que
frequentam e trabalham em nossos prédios. É necessário recuperar a capacidade de
mobilização por meio do diálogo e do convencimento, características que definem a
própria natureza da Universidade. Ao abrirmos mão dessas qualidades, igualamo-nos a
um regime qualquer, no qual as vontades se impõem pela força, esvaindo-se não muito
tempo depois, sem deixar conquistas, apenas traços de intolerância e isolamento.

Sobre os professores que fazem um abaixo assinado contra métodos aprovados em assembleias estudantis, dizendo que é uma minoria de extremistas que promovem baderna. Sua opinião sequer deve ser respeitada. Isso é muito absurdo.
O piquete no meu curso, a Letras, ganhou em todas as assembleias. Inclusive na última, na segunda-feira, dia 21, quando mais de 500 estudantes estiveram presentes. O piquete só teve de ser aprovado, pois professores se achavam no direito de quando votamos pela greve na primeira semana de mobilização, dar aulas, provas e trabalhos.
Mais de 1.000 estudantes da FFLCH votam greve e piquete em assembleias de curso com discussões de dias, comandos de greve e mobilização, saem às ruas, apanham da polícia, correm risco de punição acadêmica…parte deles ocupam a reitoria e sofrem sem água e luz em situação quase insalubre.
Já os 150 professores, cuja maioria sequer saiu de seus gabinetes para debater com a própria categoria, assinam seu nome precedido do famoso “Dê-Erre” num manifesto de repúdio, e querem ser a voz moral de uma comunidade acadêmica de humanidades com mais de 15 mil membros.
É sobre essa pretensão de poder, que nós, grevistas há 23 dias estamos tratando. Chega de decisões por cima de uma burocracia inócua e adaptada ao fechamento político, à repressão, ao sucateamento do ensino. Chega da voz dos “Dê-Erres” serem ouvidas 500 vezes mais alto que a voz de cada estudante nos órgãos de poder da USP. (R.G.)