Para Francisco, os marginalizados são os primeiros a compreender a mensagem de Jesus

Quem foram os primeiros a receber a notícia do nascimento de Jesus? Os pastores, porque “estavam entre os últimos, os marginalizados”. São esses, os mais capazes de acolher e compreender a mensagem do Salvador, acredita o Papa Francisco que, na noite de terça-feira, lembrou precisamente os marginalizados.
Francisco celebrou pela primeira vez, enquanto chefe da Igreja Católica, e diante de milhares de fiéis, a chamada Missa do Galo, a celebração que para os católicos marca o Natal, ou seja, o nascimento de Jesus. A eucaristia teve a participação de 30 cardeais, 40 bispos, 250 sacerdotes e 14 diáconos. A celebração decorreu na noite de terça-feira, na Basílica de São Pedro, no Vaticano.
Como tem sido marca do seu pontificado, Francisco lembrou “os últimos e os excluídos” e vincou que foram estes os primeiros que entenderam o alcance para a Humanidade do nascimento de Jesus, considerado o filho de Deus pelos cristãos. “Os pastores foram os primeiros que receberam o anúncio do nascimento de Jesus. Foram os primeiros porque estavam entre os últimos, os marginalizados”, disse o Papa numa homilia que foi breve, citada pela AFP.
Durante a sua comunicação, o Papa instou os católicos a abrirem os seus corações e a combaterem o espírito das trevas. “Se o nosso coração está fechado, se estamos dominados pelo orgulho, pela mentira, narcisismo, então as trevas cairão sobre nós”, afirmou o papa Francisco durante a cerimónia que foi transmitida por televisão, em directo, para 65 países.
As leituras desta celebração evocam as trevas e como Jesus é a passagem para a luz; e Francisco recordou isso mesmo ao reafirmar que: “Jesus veio libertar-nos das trevas e dar-nos a luz”.
O Papa reflectiu sobre “as luzes e trevas” que afectam o mundo. Lembrou que também na vida de cada um se “alternam os momentos luminosos e os obscuros, luzes e sombras”, e que os fiéis não devem temer o mundo marcado por “luzes e sombras”.
“Se amamos Deus e os irmãos, caminhamos na luz, mas se o nosso coração se fecha, se prevalecem o orgulho, a mentira, a busca do interesse próprio, então as trevas rodeiam-nos, por dentro e por fora”, alertou.
Aos milhares de peregrinos e turistas que marcaram presença em São Pedro, o chefe da Igreja Católica pediu para que não temam, porque o “nosso Pai tem paciência connosco, ama-nos, é a luz que dissipa as trevas”.
Após a eucaristia, Francisco colocou a imagem do Menino Jesus no presépio montado dentro da basílica, e um grupo de dez crianças, representando os cinco continentes, depositou flores em homenagem à encarnação de Deus. (Público, Portugal)

Na Missa da Noite de Natal o Papa Francisco proferiu a seguinte homilia:
1. «O povo que andava nas trevas viu uma grande luz» (Is 9, 1).
Esta profecia de Isaías não cessa de nos comover, especialmente quando a ouvimos na liturgia da Noite de Natal. E não se trata apenas dum facto emotivo, sentimental; comove-nos, porque exprime a realidade profunda daquilo que somos: somos povo em caminho, e ao nosso redor – mas também dentro de nós – há trevas e luz. E nesta noite, enquanto o espírito das trevas envolve o mundo, renova-se o acontecimento que sempre nos maravilha e surpreende: o povo em caminho vê uma grande luz. Uma luz que nos faz reflectir sobre este mistério: o mistério do andar e do ver. Andar. Este verbo faz-nos pensar no curso da história, naquele longo caminho que é a história da salvação, com início em Abraão, nosso pai na fé, que um dia o Senhor chamou convidando-o a partir, a sair do seu país para a terra que Ele lhe havia de indicar. Desde então, a nossa identidade de crentes é a de pessoas peregrinas para a terra prometida. Esta história é sempre acompanhada pelo Senhor! Ele é sempre fiel ao seu pacto e às suas promessas. «Deus é luz, e n’Ele não há nenhuma espécie de trevas» (1 Jo 1, 5). Diversamente, do lado do povo, alternam-se momentos de luz e de escuridão, fidelidade e infidelidade, obediência e rebelião; momentos de povo peregrino e de povo errante.
E, na nossa historia pessoal, também se alternam momentos luminosos e escuros, luzes e sombras. Se amamos a Deus e aos irmãos, andamos na luz; mas, se o nosso coração se fecha, se prevalece em nós o orgulho, a mentira, a busca do próprio interesse, então calam as trevas dentro de nós e ao nosso redor. «Aquele que tem ódio ao seu irmão – escreve o apóstolo João – está nas trevas e nas trevas caminha, sem saber para onde vai, porque as trevas lhe cegaram os olhos» (1 Jo 2, 11). 2. Nesta noite, como um facho de luz claríssima, ressoa o anúncio do Apóstolo: «Manifestou-se a graça de Deus, que traz a salvação para todos os homens» (Tt 2, 11).
A graça que se manifestou no mundo é Jesus, nascido da Virgem Maria, verdadeiro homem e verdadeiro Deus. Entrou na nossa história, partilhou o nosso caminho. Veio para nos libertar das trevas e nos dar a luz. N’Ele manifestou-se a graça, a misericórdia, a ternura do Pai: Jesus é o Amor feito carne. Não se trata apenas dum mestre de sabedoria, nem dum ideal para o qual tendemos e do qual sabemos estar inexoravelmente distantes, mas é o sentido da vida e da história que pôs a sua tenda no meio de nós. 3. Os pastores foram os primeiros a ver esta «tenda», a receber o anúncio do nascimento de Jesus. Foram os primeiros, porque estavam entre os últimos, os marginalizados. E foram os primeiros porque velavam durante a noite, guardando o seu rebanho. Com eles, detemo-nos diante do Menino, detemo-nos em silêncio. Com eles, agradecemos ao Pai do Céu por nos ter dado Jesus e, com eles, deixamos subir do fundo do coração o nosso louvor pela sua fidelidade: Nós Vos bendizemos, Senhor Deus Altíssimo, que Vos humilhastes por nós. Sois imenso, e fizestes-Vos pequenino; sois rico, e fizestes-Vos pobre; sois omnipotente, e fizestes-Vos frágil.
Nesta Noite, partilhamos a alegria do Evangelho: Deus ama-nos; e ama-nos tanto que nos deu o seu Filho como nosso irmão, como luz nas nossas trevas. O Senhor repete-nos: «Não temais» (Lc 2, 10). E vo-lo repito também eu: Não temais! O nosso Pai é paciente, ama-nos, dá-nos Jesus para nos guiar no caminho para a terra prometida. Ele é a luz que ilumina as trevas. Ele é a nossa paz. Amen.
Basílica de S. Pedro, 24 de Dezembro de 2013