O escracho no Brasil era praticado nos trotes universitários. Proibidos, pelo golpe de 64, foram transformados em carnaval fora de época. Atualmente virou um zona: os estudantes promovem orgias, assédio sexual, assédio moral, inclusive existem casos de mortes e estupros.
O último trote que participei aconteceu em Natal, em 1061, no primeiro ano do governo de Aluísio Alves. Abria o trote uma faixa: “A entrada no Palácio Potengi é Clara e Franca”, nomes de duas jovens da alta sociedade de Natal, consideradas amantes de Aluísio. Naqueles tempos não existia o politicamente correto de chamar uma amante de “noiva”.
No trote, além de cartazes e fantasias criticando os políticos, um caixão de defunto, com um rabo de fora. Na tampa do caixão o nome Leão do secretário de Segurança do Estado.
Os estudantes cercaram o Palácio Potengi, sede do governo, e apesar das ameaças de um pelotão da polícia, só dispersaram depois de recebidos pelo governador. Foi entregue uma lista de reivindicações.
Sobre os trotes, o testemunhal de Cristina Moreno de Castro: a “UFMG vem sendo palco de trotes com cunho racista e nazista, que nunca tinham sido vistos lá”.
Outra prática de escracho: a serração da velha. Escreve Câmara Cascudo: “No Brasil conheceu-se desde princípios do sec. XVIII a cerimônia caricata de serrar a velha durante a Quaresma. Os dias variavam, vindo até o Sábado de Aleluia. Um grupo de foliões serrava uma tábua, aos gritos estridentes e prantos intermináveis, fingindo serrar uma velha que, representada ou não por algum vadio da banda, lamentava-se num berreiro ensurdecedor: Serra a velha! Serra a velha! E a velha gritando, gritando. Vezes ocorria essa comédia diante da residência de pessoas idosas (…).
Vez por outra a Serração da Velha era feita fora da Quaresma e com intenção política, demonstração de desagrado, à porta de um chefe decaído ou derrotado nas eleições”.
Estudante, participei de uma Serração da Velha. Isso acontecia na noite escura. Para incomodar o sono de agiotas e avarentos e políticos. Gritava-se: “Quando tu morrer que vais levar para o inferno? Teu palacete? Tua botija de ouro? O dinheiro da prefeitura?” Eram listados os bens do figuraço. Qualquer luz acesa na residência, a turma da baderna corria.
A queimação de Judas
Historia Cascudo: “São bonecos de palha ou de pano, rasgados e queimados no Sábado de Aleluia. Tradição popularíssima na Península Ibérica, radicou-se em toda a América Latina desde os primeiros séculos da colonização européia. No Rio de Janeiro oitocentista os Judas tinham fogos no ventre e apareciam conjugados com demônios, ardendo todos numa apoteose policolor, extremamente aplaudida pelo povo e registrada por Debret”.
Apesar de proibida, a malhação de Judas persiste.

Escreve Sílvio Anaz:
Políticos são os Judas preferidos dos brasileiros
“Desde os tempos coloniais, o brasileiro tem incluído as autoridades e os principais problemas públicos entre os Judas da vez. Na tradicional malhação da rua dos Lavapés (em João Pessoa), que existe desde a década de 20, vários Judas são preparados para dar conta de todos os desafetos da comunidade. Entre eles estão sempre os moradores mais ranzinzas e os políticos mais rejeitados. Em 2007, foram oito os Judas malhados na rua dos Lavapés. Seis representavam políticos, do prefeito da cidade aos presidentes do Brasil e dos Estados Unidos. Um representava um personagem corrupto de uma popular novela da televisão e, o oitavo, referia-se a um dos moradores do bairro.
Os ingleses queimam Guy Fawkes
No reinado de Jaime I, filho de Maria Stuart, a Inglaterra teve várias conjuras. A mais perigosa, para André Maurois, “foi a célebre Conspiração da Pólvora (1605). Era seu objetivo matar ao mesmo tempo o rei, os Lordes e os Membros dos Comuns que estivessem presentes, fazendo ir pelo ar a Câmara dos Lordes quando todos lá estivessem reunidos. Como os protestantes estavam privados, de súbito, dos seus chefes, uma rebelião católica teria talvez triunfado, porque se contava com a inércia das massas. Pela qualidade dos culpados e pelos métodos empregados, a conspiração evoca quanto a nós as dos terroristas russos nos fins do século XIX. Os conjurados eram fidalgos. O mais célebre deles, Guy Fawkes, aprendera a arte das minas e túneis na campanha de Flandes.

Guy Fawkes e os seus amigos alugaram, primeiro, uma loja frente ao Parlamento, mas em breve descobriram por um acaso um local, situado exatamente debaixo da Câmara dos Lordes, o que dispensava de cavarem eles a mina. Alugaram o local e foram amontoando barris de pólvora, escondidos debaixo de feixes de lenha. O atentado teria atingido os seus fins, se os conspiradores não julgassem indispensáveis prevenir alguns dos partidários para organizar a revolta, após a explosão. Um dos que sabiam do segredo achou de seu dever informar o governo. Guy Fawkes ficou só, corajosamente, para acender a mecha no momento preciso; foi preso (5 de novembro de 1605) e supliciado.

Com ele morreram os cúmplices e também o Provincial dos jesuítas ingleses, Garnet, acusado de ter aconselhado o crime. Parece que a acusação era falsa. Henry pecou apenas pelo silêncio, mas a indignação provocada pela descoberta de tão grave atentado, que pouco faltou para ser perpetrado, tornou os católicos mais suspeitos do que nunca. Privaram-nos dos direitos políticos como também os declararam incapazes de exercer as profissões de advogado e médico e até de gerir os bens dos filhos menores. A Conspiração da Pólvora consumou por muito tempo a ruína do catolicismo na Inglaterra. O papismo, para muitos espíritos ficou ligado à sombria imagem de conspiração contra a segurança do Estado – que nunca chegou a provar-se; durante um século todo o homem político, todo o soberano suspeito de aliança com Roma, era condenado pela opinião pública”.
A distorção da personagem histórica Guy Fawkes no Anonymus precisa ser estudada. Uma história em quadrinhos e o cinema criaram uma máscara hoje cultuada.
