Romeu Tuma Junior, filho de Romeu Tuma, lembra o poder do pai como delegado da ditadura militar.
Relata a Wikipédia: “Descendente de sírios, Romeu Tuma foi investigador e depois, delegado de polícia do Estado de São Paulo.
Foi diretor geral do Departamento de Ordem Polícia e Social (DOPS) paulista de 1977 a 1982. De acordo com o livro Habeas Corpus, lançado em janeiro de 2011 pela Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República, Tuma participou ativamente na ocultação de cadáveres de militantes políticos assassinados sob tortura e no falseamento de informações que poderiam levar à localização dos corpos dos desaparecidos políticos”.
Importante que o filho recorde. Que Tuma trabalhou em dupla com o delegado Fleury, também sequestrador, torturador e assassino.
Fleury foi condecorado pelo governador Abreu Sodré e escolhido, pela imprensa, delegado do ano em duas oportunidades (1974 e 1976), em meio a diversas acusações de tortura e homicídios.
Tuma Filho, finalmente, confessa que atuou nos tempos de chumbo.
Lembra: “Eu e o Lula vivemos juntos esse momento. Ninguém me contou. Eu vi o Lula dormir no sofá da sala do meu pai. Presenciei tudo”.
Por liderar as greves dos metalúrgicos da Região do ABC no final dos anos 70 e início de 1980, Lula foi preso, cassado como dirigente sindical e processado com base na Lei de Segurança Nacional.
“Sala” é eufemismo. Pode ser qualquer local de uma delegacia. Inclusive cela. Que naqueles tempos, e hoje, cada vez mais, a polícia, sem autorização judicial, realiza as ilegais e arbitrárias prisões debaixo de vara.
Informe histórico do Instituto Baiano de Direito Processual Penal:
O art. 95 do Código de Processo Criminal do Império, de 1832, dizia:
Art. 95. As testemunhas, que não comparecerem sem motivo justificado, tendo sido citadas, serão conduzidas debaixo de vara, e soffrerão a pena de desobediencia.
No século XX, a palavra “vara” desapareceu do texto legal como ferramenta relacionada à condução dos desobedientes à presença dos magistrados e o termo passou a designar o local do exercício da função judicante, sinônimo de juízo ou tribunal de primeira instância. Porém, o instituto da “condução sob vara” permaneceu no CPP de 1941, com a finalidade original, mas outra formulação. De fato, de acordo com o art. 218 do CPP:
Art. 218. Se, regularmente intimada, a testemunha deixar de comparecer sem motivo justificado, o juiz poderá requisitar à autoridade policial a sua apresentação ou determinar seja conduzida por oficial de justiça, que poderá solicitar o auxílio da força pública.
Nos tempos da ditadura, suspeitos de crimes políticos eram “convidados” ou intimados ou presos, e ficavam horas ou dias esperando ser ouvidos nas “salas” das autoridades.
Um “convidado” que não comparecesse respondia a processo de desacato à autoridade. Este tipo de stalking policial continua no Brasil de hoje.
A constante presença – as idas e vindas às delegacias -, principalmente quando solta sem marca de espancamento, ou processo para responder, a vítima passava à condição de suspeita, não para o regime, mas para os que combatiam a ditadura militar. E considerada colaboracionista, informante ou delator. Mesmo que a pessoa cantasse sob tortura.
Esse jogo policial da direita tem parecência com o da esquerda: de pedir a um amigo que guarde livro da lista censurada ou material de propaganda, ou citar uma pessoa neutra em um interrogatório ou simplesmente anotar o nome de um amigo ou amiga em caderneta de endereço, mesmo sem nenhuma intenção de comprometer.
Em tempo de guerra suja o mundo fica pelo avesso. E abertas as portas do inferno. Que precisam ser fechadas. Com o fim da prisões conduzidas debaixo de vara pela polícia, notadamente nas manifestações de ruas, com a criminalização dos movimentos sociais, estudantis e greves. As delegacias e presídios estão superlotados. São presos sem processo ou julgamento. E só com a abertura dos arquivos da ditadura, inclusive na justiça, conheceremos os verdadeiros mártires, os sequestradores, os torturadores, os assassinos, os falsos heróis, os alcaguetes, os infiltrados, os exilados de “mentirinha”, as vítimas da esquerda e da direita.
Divulga a Tribuna da Imprensa
Romeu Tuma Junior, filho de Romeu Tuma e secretário nacional de Justiça do governo Lula entre 2007 e 2010, rompe o silêncio e conta tudo no livro “Assassinato de Reputações – Um Crime de Estado”, publicado pela Editora Topbooks (557 págs., R$ 69.90). O trabalho resulta de um depoimento prestado ao longo de dois anos ao jornalista Cláudio Tognolli. E Tuma Júnior está com documentos e quer falar no Congresso. Abaixo, seguem trechos de sua entrevista à VEJA.
Por que Assassinato de Reputações?
Durante todo o tempo em que estive na Secretaria Nacional de Justiça, recebi ordens para produzir e esquentar dossiês contra uma lista inteira de adversários do governo. 0 PT do Lula age assim. Persegue seus inimigos da maneira mais sórdida. Mas sempre me recusei. (…) Havia uma fábrica de dossiês no governo. Sempre refutei essa prática e mandei apurar a origem de todos os dossiês fajutos que chegaram até mim. Por causa disso, virei vítima dessa mesma máquina de difamação. Assassinaram minha reputação. Mas eu sempre digo: não se vira uma página em branco na vida. Meu bem mais valioso é a minha honra.
De onde vinham as ordens para atacar os adversários do PT?
Do Palácio do Planalto, da Casa Civil, do próprio Ministério da Justiça… No livro, conto tudo isso em detalhes, com nomes, datas e documentos. Recebi dossiês de parlamentares, de ministros e assessores petistas que hoje são figuras importantes no atual governo. Conto isso para revelar o motivo de terem me tirado da função, por meio de ataque cerrado a minha reputação, o que foi feito de forma sórdida. Tudo apenas porque não concordei com o modus operandi petista e mandei apurar o que de irregular e ilegal encontrei.
(…)
O Cade era um dos instrumentos da fábrica de dossiês?
Conto isso no livro em detalhes. Desde 2008, o PT queria que eu vazasse os documentos enviados pela Suíça para atingir os tucanos na eleição municipal. O ministro da Justiça, Tarso Genro, me pressionava pessoalmente para deixar isso vazar para a imprensa. Deputados petistas também queriam ver os dados na mídia. Não dei os nomes no livro porque quero ver se eles vão ter coragem de negar.
O senhor é afirmativo quando fala do caso Celso Daniel. Diz que militantes do partido estão envolvidos no crime.
Aquilo foi um crime de encomenda. Não tenho nenhuma dúvida. Os empresários que pagavam propina ao PT em Santo André e não queriam matar, mas assumiram claramente esse risco. Era para ser um sequestro, mas virou homicídio.
(…)
O senhor também diz no livro que descobriu a conta do mensalão no exterior.
Eu descobri a conta do mensalão nas Ilhas Cayman, mas o governo e a Polícia Federal não quiseram investigar. Quando entrei no DRCI, encontrei engavetado um pedido de cooperação internacional do governo brasileiro às Ilhas Cayman para apurar a existência de uma conta do José Dirceu no Caribe. Nesse pedido, o governo solicitava informações sobre a conta não para investigar o mensalão, mas para provar que o Dirceu tinha sido vítima de calúnia, porque a VEJA tinha publicado uma lista do Daniel Dantas com contas dos petistas no exterior. O que o governo não esperava é que Cayman respondesse confirmando a possibilidade de existência da conta. Quer dizer: a autoridade de Cayman fala que está disposta a cooperar e aí o governo brasileiro recua? É um absurdo.
(…)
O senhor afirma no livro que o ex-presidente Lula foi informante da ditadura. É uma acusação muito grave.
Não considero uma acusação. Quero deixar isso bem claro. O que conto no livro é o que vivi no Dops. Eu era investigador subordinado ao meu pai e vivi tudo isso. Eu e o Lula vivemos juntos esse momento. Ninguém me contou. Eu vi o Lula dormir no sofá da sala do meu pai. Presenciei tudo. Conto esses fatos agora até para demonstrar que a confiança que o presidente tinha em mim no governo, quando me nomeou secretário nacional de Justiça, não vinha do nada. Era de muito tempo. 0 Lula era informante do meu pai no Dops (veja o quadro ao lado).
O senhor tem provas disso?
Não excluo a possibilidade de algum relatório do Dops da época registrar informações atribuídas a um certo informante de codinome Barba.