Um magistrado no Amazonas propõe transformar o novo estádio de Manaus num centro de triagem de detentos logo após os jogos da Copa

Eu tinha previsto esta possibilidade. Isso fez Pinochet no Chile.

O Brasil, uma democracia disfarçada da justiça absolutista, da política dos governadores, da criminalização dos movimentos sociais, tem que arranjar uma maneira de ocupação dos estádios que ficarão sem funcionalidade após a Copa do Mundo.

Na África estádios viraram uma mistura de casa de show,  motel, boate, campo para a prática de diferentes esportes.

Escreve Frederico Rosas, in El País, Espanha:

Primeiro os gols, depois o xilindró

Croqui da Arena Amazônia, que está sendo construída em Manaus. / DIVULGAÇÃO GOVERNO DO AMAZONAS
Croqui da Arena Amazônia, que está sendo construída em Manaus. / DIVULGAÇÃO GOVERNO DO AMAZONAS

A falta de políticas claras em relação ao uso de algumas arenas após a Copa do Mundo no Brasil conseguiu gerar uma proposta no mínimo inusitada no Amazonas, na região norte do país, na fronteira com Colômbia, Peru e Venezuela. O desembargador Sabino Marques, do Tribunal de Justiça amazonense, sugeriu que o espaço físico da Arena Amazônia sirva também para a triagem de detentos em Manaus, capital do Estado. “A sugestão foi feita e está de pé”, afirmou por telefone ao EL PAÍS o desembargador, que preside o Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário amazonense. O objetivo da medida é amenizar a lotação da Cadeia Pública Raimundo Vidal Pessoa, também em Manaus.

Com previsão de entrega de suas obras em dezembro deste ano, a Arena Amazônia terá capacidade para pouco mais de 42.000 espectadores segundo a Fifa e abrigará quatro partidas da primeira fase da Copa. O estádio substitui o antigo Vivaldo Lima (Vivaldão), inaugurado em 1970 e já demolido. Enquanto isso, uma pesquisa elaborada pela Pluri Consultoria, que realiza estudos para o mercado esportivo, mostra que o Campeonato regional do Amazonas apresentou média de público de 807 pessoas por jogo neste ano. O número representa menos de 2% da capacidade da Arena Amazônia durante a Copa.

O Amazonas foi o 19º Estado em média de público no país, enquanto o Estado vizinho, Pará, com times de maior expressão no cenário nacional, como Paysandu e Remo, foi o quarto. Com 5.022 espectadores, os paraenses foram superados apenas por Minas Gerais (6.451), São Paulo (6.217) e Pernambuco (5.339). Os paraenses, entretanto, não foram contemplados com estádios para a Copa, assim como o restante dos Estados da região Norte.

Segundo apresentação da Fifa, a Arena Amazônia “pode não ser um palco tradicional do futebol brasileiro, mas certamente atrairá um grande número de torcedores graças à sua localização privilegiada, no coração da maior floresta contínua do mundo”. A proposta é que sirva como polo de atração turística para shows e eventos na região, ainda de acordo com o site da entidade.

O orçamento das obras para a implantação da nova arena gira em torno de 605 milhões de reais (262 milhões de dólares), segundo levantamento do Sindicato Nacional de Arquitetura e da Engenharia (Sinaenco). A Ordem dos Advogados do Amazonas (OAB/AM), que representa os advogados no Estado, emitiu nota em que afirma discordar de forma veemente da possibilidade desse desvio de finalidade quanto ao uso da Arena Amazônia. O comunicado justifica “o determinante motivo de sua construção, a realização do evento esportivo ‘Copa do Mundo’, bem como o seu legado ao esporte local e à cidade” de Manaus. Se o plano de triagem de presos seguir adiante, o legado real da Fifa na arena amazonense poderá ser a criação do primeiro elefante branco depois da Copa de 2014.

Publicado por

Talis Andrade

Jornalista, professor universitário, poeta (13 livros publicados)

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